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Tereza.

por FJV, em 19.01.09

Éramos da mesma idade mas de gerações diferentes. Ela chegou antes a vários lugares – a muitos livros e intuições. Tereza Coelho, que agora partiu, não foi apenas uma das nossas melhores jornalistas da área da cultura; foi também uma editora que mudou o mundo à sua volta. No ano passado morreram dois editores invulgares, corajosos e cultíssimos, que transformaram o mundo da edição, Rogério de Moura (Livros Horizonte) e Figueiredo de Magalhães (o genial criador da Ulisseia). De algum modo, é uma parte do mundo da edição que desaparece e fica mais pobre. Não podia ser de outra maneira: editar não é publicar livros. É chegar antes a vários lugares; aos livros, mas sobretudo aos livros que fazem falta a alguém que não é como nós. É escolher. É imaginar. Imaginar o mundo.

[Da coluna do Correio da Manhã.]

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Rodrigues da Silva.

por FJV, em 11.01.09

[Foto de Margarida Ferra, no Bibliotecário de Babel]

 

Morreu José Manuel Rodrigues da Silva, 69 anos, editor do JL, jornalista que conhecia há muito, do Diário Popular, do Diário de Lisboa ou de O Jornal. Doente há algum tempo, prometia resistir mesmo quando desanimava. Era um homem de outro tempo, rodeado de livros e de cinema. Vai, agora, encontrar-se com outros amigos para continuar conversas interrompidas.

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António Alçada Baptista (1927-2008).

por FJV, em 07.12.08

 

Viajante, ensaísta, memorialista (Peregrinação Interior), editor (na Moraes), ficcionista (O Riso de Deus) – o António Alçada era sobretudo um conversador e um sedutor. Ele seduzia as pessoas com quem se cruzava ao longo da vida, e seduzia os seus leitores com aquele tom suave, como é a inocência da sua obra. Estabeleceu uma ponte entre os dois regimes, em 1974 (as suas Conversas com Marcelo Caetano foram uma última tentativa de ler o regime e O Tempo e o Modo uma forma de o mudar). Tinha uma inteligência muito intuitiva, o que o levava a pensar com leveza sobre coisas profundas. E chegava antes dos outros a conclusões que poucos hoje lhe atribuem. Isso fazia dele um homem generoso de quem era difícil não gostar. Muita gente lhe deve muita coisa.

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Ramiro Fonte (1957-2008)

por FJV, em 12.10.08

 

O poeta Ramiro Fonte (que era, também, director do Instituto Cervantes de Lisboa) morreu em Barcelona este fim-de-semana.

[Ramiro Fonte em Barcelona,

em Junho deste ano]

 

PROMESA

Quizá fuesen mejores
Nuestros corazones cuando eran frágiles
Y algún golpe de mar, o la noche de julio
Pudieran abrirles las calladas heridas
Que ahora, y para siempre, llamaremos nostalgias.
Quizá fuesen mejores cuando eran
Cual regatos ligeros o lluviosas tardes
Que mojaban la infancia y partían
Un dominio común; un valle abierto,
Inmensos arenales, aquel balcón
Detenido en la presencia de pulidos geranios.
No eligieron barcos para partir lejos;
Ni la brisa liviana de un verano
Para que los apagase, con su fuego insumiso.
Semejantes a los hombres, desearon
A los árboles antiguos de esta tierra.

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Adeus.

por FJV, em 03.10.08

 

Adeus, Dinis. Até amanhã, entre fumo e histórias — as de futebol e andorinhas, as que nos enchiam de riso e as que havemos de contar ainda.

Dinis Machado, o autor de O Que Diz Molero, morreu hoje, sexta-feira. Ele era, também, Dennis McShade.

 

 

 

Dinis Machado é o autor de um dos livros que, se fôssemos mais tocados pela palavra «gratidão», elogiaríamos com mais frequência: O Que Diz Molero, publicado quando a ficção portuguesa não sabia que era portuguesa e ignorava que tinha de trocar de bandeiras, por volta de 1977. O Que Diz Molero, o livro que não envelhece, foi o primeiro grande best-seller de ficção portuguesa depois da revolução e transportava uma imensa alegria nas suas páginas. Ora, na época em que a chamada «literatura policial» não se escrevia em nome próprio (até porque, no Portugal de Salazar, não havia razões para que os romances se ocupassem de crimes lusitanos – que «não existiam»), Dinis Machado inventou um personagem admirável, o assassino Peter Maynard (devedor de Pierre Ménard, a quem Jorge Luis Borges atribui a proeza de reescrever o Quijote palavra a palavra), e um pseudónimo adequado para figurar como autor: Dennis McShade. [Do Editorial da LER 72]

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More die of heartbreak.

por FJV, em 08.09.08

 

Fotografias de Pedro Ornelas.

 

 

 

Morrem mais de mágoa, na tradução portuguesa do livro de Bellow — só para dizer que isto não fica assim. Só agora soube (pelo Ivan) que morreu o Pedro Ornelas, autor de um dos meus blogs preferidos.

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Gulag.

por FJV, em 07.08.08

 

O desaparecimento de Alexandre Soljenitsine não significa hoje grande coisa para a maior parte das pessoas, mas a verdade é que o escritor que denunciou tão abertamente os campos de morte soviéticos poderia ter outro destino se não fosse o Gulag. Soljenitsine foi odiado pela esquerda que continuou a proteger, mesmo depois da ‘perestroika’, o direito de o socialismo matar e condenar milhões à fome e ao terror. Tal como Tolstoi, foi um moralista e um homem religioso; como muitos outros, nunca conseguiu sobreviver longe da ‘mãe Rússia’, ocupada pelo comunismo primeiro e pelos gangsters do capitalismo depois. A velha Rússia de Tolstoi, de Gogol, de Akhmatova ou de Brodsky, foi para si uma lenda amável e dolorosa. Mas os que o condenaram ao Gulag e ao silêncio não lhe sobreviveram.

[Da coluna do Correio da Manhã.]

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Alfredo.

por FJV, em 25.05.08

 

Trabalhei com ele. Li os seus livros. Almoçávamos de tempos a tempos. Apresentou um dos meus livros. Apresentei um dos dele. Tinha por Alfredo Saramago um grande respeito, uma amizade cúmplice e malandra -- e a gratidão pelos charutos que trocámos. Outro dos grandes homens cultos da minha terra que desaparece. Aos setenta anos a poeira da terra saberá reconhecê-lo.

Maio está a ser muito pesado para mim.

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Despedidas.

por FJV, em 21.05.08

  

Nunca se devia dizer nada, nunca se devia chorar desta maneira. Torcato Sepúlveda, amigo de muitas horas, de muitas conversas, meu companheiro de tanta literatura gasta e por gastar, a voz, a fúria, a zanga, os livros, a memória de muitas páginas, o leitor amável, o leitor furioso, o céptico entusiasta, os bancos de jardim, o Jardim da Parada logo de manhã, os jornais, as estantes, os bares, as varandas sobre a planície. Nunca se devia chorar desta maneira a quem nunca se dirá adeus, adeus, adeus, mesmo que essa palavra exista, mesmo que essa palavra não exista lá, para onde vais.

 

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Que pena.

por FJV, em 01.02.08


É um homem como os outros. É uma pena. Acabou-se.

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Retratos que ficam.

por FJV, em 17.01.08



Uma coisa é o que pensamos sobre a vida e outra, diferente, é o que ela é. Eu recordo a Linha do Tua, como antes recordava a Linha do Sabor, ou a do Corgo. Viajei em todas elas, lembro as carruagens sujas e velhas, pintadas de verde, de azul e de laranja. Primeiro, acabou uma, depois outra e, finalmente, a do Tua (são essas fotos aí). Uma pessoa compreende os riscos de exploração financeira, o prejuízo nas contas da CP e da Refer, tudo. Mas, «inexplicavelmente», protesta. Tem pena desses retratos que ficam. Das noites em que o comboio se aproximava da estação do Tua (vindo de Bragança) e nunca se sabia se havia ligação na Linha do Douro. Das tempestades ao longo do Tua, naquele eixo que vai de Mirandela ao Cachão. Tal como tem pena das cerejeiras no planalto do Carvalhal, Felgar, Carviçais, quando havia comboio até Duas Igrejas. Ou dos vales de Curalha, no Tâmega, de Carrazedo, no Corgo, da passagem do Alvão. Uma pessoa compreende, mas tem pena.

Ver continuação de conversa com o João Villalobos e o Rui Vasco Neto.

Fotos de Aníbal Gonçalves, Nuno Antunes e António Amorim.

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Luiz Pacheco.

por FJV, em 11.01.08
Já disponível online o artigo de Rui Ramos sobre Luiz Pacheco, do Público.

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Luiz Pacheco, 1925-2008

por FJV, em 06.01.08


Esta fotografia (de João Francisco Vilhena) foi capa da revista Ler quando publicámos uma entrevista (de João Paulo Cotrim) com Luiz Pacheco. Morreu há pouco, no Montijo. Deixa atrás de si um rasto de livros, de pequena glória, de literatura, de amizades e de fugas; mas não de morte. Editor (de Vergílio Ferreira, Cesariny, Herberto, Natália Correia, António Maria Lisboa) que poderia ter sido mais, autor (de Comunidade, de O Teodolito, de Literatura Comestível, de O Libertino Passeia por Braga, a Idolátrica, o Seu Esplendor, de Textos de Guerrilha, de Memorando, Mirabolando, de Exercícios de Estilo, de Diário Remendado 1971-1975) leitor minucioso e cruel, voz incómoda, Pacheco viveu miseravelmente a maior parte da sua vida. Não o lamentemos por isso; viveu como quis, sem hipotecar-se. Viveu em  liberdade.



Links: Site Oficial/Não Oficial, Textos de Luiz Pacheco, Entrevista à Kapa (no Funcionário Cansado), Entrevista de João Pedro George.
Via Atlântico.

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Despedidas no final do ano.

por FJV, em 01.01.08
Agora, foi o Olímpio Ferreira, homem dedicado aos livros, para quem tanto viveu.
[Ver as evocações do Eduardo e do José Mário.]

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Julien Gracq, 1910-2007.

por FJV, em 23.12.07


Era o «classique moderne» francês, «le dernier des classiques», o autor de A Costa das Sirtes.
Pierre Assouline tinha escrito sobre ele um mês antes de Gracq completar 97 anos:

«Il n’écrit plus, ou plutôt, il ne publie plus depuis quinze ans, ce qui ne signifie pas qu’il a cessé de remplir des petits carnets, de lire ou d’observer le monde depuis sa maison de famille de Saint-Florent-le-Vieil sur les bords de Loire. Désormais seul depuis la mort de sa soeur auprès de qui il vivait dans les meubles de leurs parents, il consacre ses journées à la découverte des livres qu’on lui envoie, à répondre aux lettres avec une urbanité et une politesse d’un autre âge, à recevoir les visiteurs et à marcher.  Drôle de personnage: une vie retirée de longue date, le refus du Goncourt, seize livres vendus non massicotés et tous publiés chez le même libraire-éditeur José Corti, le refus du passage obligé par les fourches caudines de la télévision, le refus du livre de poche. Gracq, c’est l’écrivain qui dit non.»

É um esplêndido texto de homenagem que termina assim:

«Il partira convaincu que le public de ses splendides fragments n’existera plus en 2020, la culture dite horizontale (toute la littérature mondiale) l’ayant emporté sur la culture dite verticale (l’héritage des Anciens). S’il doit vraiment n’en rester que quelques uns, soyons ceux-là

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...

por FJV, em 10.11.07
||| Até logo.










A morte de um amigo cala-nos durante horas, durante muito tempo. O Armando Rafael era um amigo especial, caloroso, sério; fico sem nada para dizer. Rigorosamente nada. Desprotegido. Com a sensação de que estamos todos reduzidos ao silêncio. Mas sobretudo desprotegido. Sem nenhuma explicação.
[FJV]

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por FJV, em 10.11.07
||| Mr. Mailer (1923-2007)









Ele era o modelo do escritor profissional, comprometido, cheio de vida e de opiniões. Os duros, como ele, não dançam; não voltarão a dançar.
[FJV]

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por FJV, em 21.10.07
||| José Aparecido de Oliveira.
Não é da minha geração, evidentemente, mas conheci-o numa daquelas intermináveis conversas sobre a lusofonia e a CPLP. José Aparecido, para os conhecidos, foi ministro da Cultura e governador do DF, embaixador do Brasil em Portugal e, como todos sabemos, uma das pessoas que sempre estendeu pontes entre os dois países e um dos criadores da CPLP, que acabaria por nunca funcionar como devia. O funeral foi em Conceição do Mato Dentro, Minas Gerais, e é uma pena que tenha passado tão em silêncio o seu desaparecimento. Provavelmente com o sucesso do Tratado europeu, as nossas autoridades não anotaram, como nota o Carlos Albino, todos estes factos. Fica uma homenagem, que ele merece, mesmo que nunca se tenha estado do mesmo lado da rua.
[FJV]

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por FJV, em 04.09.07
||| Vilallonga.










A morte de um aventureiro delicioso e inoportuno.
[FJV]

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...

por FJV, em 29.08.07
||| Porque tinhas “mundo” explicaste-nos o mundo…









Meu caro Eduardo,
Na noite do dia em que morreste, fui com a Rosário e as nossas mães ao Senhor Vinho, ouvir a Aldina Duarte. Era um compromisso antigo, a minha mãe estava de passagem por Lisboa, e eu tinha a certeza de que me perdoarias esse pecadilho inocente de te trocar durante umas horas por essa intérprete soberba que tantas vezes elogiaste nas tuas crónicas.
Porque foi contigo que aprendi (que aprendemos) que a postura de um intelectual na cidade tem de ser um compromisso com tudo aquilo que nela manifesta a múltipla e complexa actividade dos homens: dos livros ao cinema, da arte em geral ao futebol, da moda aos centros comerciais, da gastronomia à política.
Disse num depoimento que foste o mais importante intelectual da minha geração. E foste. Desde os tempos já tão longínquos em que, nas páginas de O Tempo e o Modo puseste em causa a noção de fidelidade para defender uma relação baseada na verdade, sempre encontrámos nos teus textos alguma coisa que nos explicava melhor o mundo, as nossas dúvidas, as nossas hesitações, os nossos erros, os nossos passos.
E os nossos passos comuns foram muitos.
Na madrugada do 25 de Abril, recordas-te?, foste tu a tocar-me à campainha e a despertar-me para a liberdade que nascia. E logo fomos (com o José António Pinto Ribeiro) mergulhar na cidade em torvelinho.
(Mergulhar na cidade – eis o que sempre fizeste e sempre ensinaste. Nas salas de aula, nos cafés, nos livros.)
Antes já tínhamos incendiado as noites de Luanda à procura do amor louco de Breton. E mais tarde tentámos a “revolução” surrealista (e, claro, fracassada) de fazer um suplemento cultural do Avante! dedicado a La Grande Bouffe, do Ferreri. Divertimo-nos à grande, Eduardo! E lá estavas tu a ensinar-me (a ensinar-nos) a independência, a ironia, a distância com que se deve lidar com todos os poderes do mundo.
Por isso nunca foste um homem do poder, mesmo passando por cargos públicos, mesmo cortejado pelos políticos, mesmo que atacado, quantas vezes, pelos arautos da “parolice” nacional.
Mas foste, isso sim, “o actor mais disponível, mediático e plural da cena portuguesa”, como escreveu no Público esse outro, grandíssimo, Eduardo (Lourenço).
Essa cena, esse palco, ficou agora vazio. As luzes apagaram-se. Já não iremos logo pela manhã viajar contigo no fio do horizonte e medir a temperatura às coisas boas e más deste país.
Não há ninguém que te suceda. Porque, de certa maneira, foste único. Rindo, castigavas os costumes. Tinhas “mundo”, como disse no dia da tua morte o Manuel Maria Carrilho. E ter “mundo” é o que mais falta a uma enorme fatia da nossa classe dirigente: na cultura como na política.
Porque tinhas “mundo” explicaste-nos o mundo. Puseste a nu os nossos ridículos, a nossa petulância, a nossa falta de maturidade cívica.
Pode ser que, lendo-te, alguns agora descubram, finalmente, esse ponto de incandescência em que a arte e a vida acabam por coincidir.
Foste tu que o escreveste.

Publicado hoje no JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias

[MAV]

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