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Serei o grego?

por FJV, em 29.03.09

O Tomás comentou o meu post sobre o encerramento das linhas do Corgo e do Tâmega juntando-lhe a referência de Maria João Avillez sobre «as duas linhas de ferro no Douro, usadas apenas por 200 pessoas por dia». Eu seria o grego, a MJA seria a troiana (o inverso não me convém). Há um problema nisso: já vi encerrar as linhas do Sabor (de Pocinho a Miranda) e do Corgo (de Vila Real a Chaves) bem como a do trecho do Douro Superior (do Pocinho a Barca d'Alva -- e ainda me lembro da ligação a Freixeneda) e percebo o argumento. Duzentas pessoas? Talvez mais, talvez menos. Talvez muitas mais. Como eu dizia no meu post, «hoje há pouco a fazer». Acabaram. Não vão recuperar-se: «Há alcatrão, cimento, camionagem e gasóleo. Tudo caro. Os comboios portugueses inventaram um país, povoaram-no, desenharam a nossa geografia. Era um país mais bonito do que este.» Tenham bom proveito; eu sou o grego. Ao contrário dos que pensam que há solução para uma parte do país, eu não acredito. Por isso, «a culpa não é da CP». É das opções que tornaram improvável e sem futuro a ferrovia regional. 

 

Adenda: Tomei muitas vezes o comboio das 04h20 da manhã para sair de Chaves rumo ao sul. Chovia lá dentro; as janelas deixavam entrar o frio (e a geada já tinha entrado antes); o aquecimento, a carvão, só funcionava aos dias ímpares; as carruagens eram limpas na Régua de vez em quando; os atrasos nunca eram justificados. Estávamos nos anos setenta. Nos anos oitenta, o cenário repetia-se. Desde há muito tempo que essas linhas estavam condenadas. A camionagem susbtituía, com vantagem, os comboios do Tua, do Corgo e do Sabor -- e havia uma indústria do asfalto mortinha por mais investimentos nas estradas. O troço entre Régua e Vila Real (26 quilómetros) demorava uma hora; se eu fizesse a viagem Chaves-Lisboa de comboio, demoraria ainda mais do que as 12 horas do autocarro. E aqui o Tomás perguntará: «E tens saudades de quê, então?» De nada. De uma ninharia. De um país que andava de comboio; eu sou o grego.

 

Adenda 2: O Douro transformado em «pólo turístico» sem a linha de comboio parece-me impossível, de resto. O investimento de 4 mil milhões de euros no TGV Lisboa-Porto-Lisboa, que gerará prejuízos, transformar-me-á em troiano.

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12 comentários

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De patricio a 29.03.2009 às 10:38

Infelizmente parece-me que será mais um troiano. Mas um Eneias, espero.
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De Antonio Serôdio a 29.03.2009 às 11:26

Não esquecer que para alem das condições descritas sobre a qualidade há que acrescentar a evolução dos horários que poderiam servir a CP, mas nunca os utentes
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De Sissi a 29.03.2009 às 11:50

A mania de deitar fora a criança com a água do banho.
Sou grega também...
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De nuno ferreira a 29.03.2009 às 13:06

É uma vergonha, Maria João Avillez e a vergonha maior é esse povinho mal vestido lá de Vila de Trás do Sol Posto querer voltar a ter comboio quando pode andar de autocarro. São uns mal agradecidos, o Cavaco, o Guterres, o Sócrates dão-lhes auto-estradas e aquela gentinha sempre a querer andar ali aos tombos, a transportar garrafões de vinho e as galinhas. Eu ainda vou ver a Maria João de TGV ao lado do europeu de Boliqueime.
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De Beijokense a 29.03.2009 às 13:38

100% de acordo com a Adenda 2.
E, quanto à culpa "das opções", o mais triste é o facto de os políticos locais entrarem nesse caminho de ferro.
http://beijokense.blogspot.com/2009/03/como-e-que-se-chama-isto.html
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De CristinaGS a 29.03.2009 às 17:47

Francisco, há nestes seus textos de saudade do que vai desaparecendo, um sofrimento sentido que me deixa apreensiva e acho que faz bem em partilhá-lo, já tenho dúvidas que os srs. que fazem de conta que governam, saibam o que isso significa e continuem alegremente a embandeirar em arco até ao esquecimento total. Abraço
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De Amêijoa Fresca a 29.03.2009 às 18:37

A fanfarrona ignorância
de novo-riquismo embebedado,
faz desta inculta errância
a marca de um país malfadado.

A irresponsabilidade morre solteira
na nossa devassa democracia ,
a cultura política é tão rasteira
revelando uma ignóbil iliteracia!

Os gregos criaram a tragédia
há milénios já passados,
nós criámos esta comédia
por políticos atrasados!

A comédia é boa para rir
quando ela tem graça,
o mexilhão gosta de se divertir
para espantar a sua desgraça!
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De Adolfo Contreiras a 29.03.2009 às 20:00

Aqui, FJV são dois gregos:
Filoctetes, ínclito representante do pensar antigo para quem os novos tempos só trazem maldade, mas igualmente para quem resistir era uma virtude.
Calcas que já vaticinou que o TGV vai dar tais prejuizos que o fará mudar de pátria.

Lembro que aquando da Expo 98, um calcas grande comentador da praça, dizia que a linha vermelha do Metro teria de fechar no dia seguinte ao encerramento da Expo. Parece que pouco tempo depois essa linha era a mais rentável de todas.
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De luis eme a 30.03.2009 às 17:02

tens razão Francisco.

andam há mais de vinte anos a ver se dão cabo do comboio, no nosso país, provavelmente o melhor transporte do mundo.

não é só no douro e em trás-os-montes , é em todo o país. há algum transporte que nos a possibilidade de cirandar de um lado para o outro, ler sem ficarmos com dores de cabeça? olhar a paisagem que vai fugindo para norte ou para sul?

a trampa de governantes que temos, só se preocupa com as negociatas que lhe enchem as contitas na suiça e os paraísos fiscais...
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De Filipe Mota Pires a 30.03.2009 às 18:56

Porque se lembrou de La Fregeneda, resolvi deixar aqui a minha total concordancia com o seu post...

Este sábado passado tive o privilegio de ir fazer uma caminhada pela desativada linha férrea internacional que ligava Salamanca ao Porto, precisamente no troço La fregeneda - Barca D'alva.

Doó o coração ver um investimento daqueles, totalmente pago pelos portugueses, votado ao abandono!!!

Nesse troço de 17 Km, existem 20 pontes e 13 túneis, e embora a linha já esteja muito degradada, e as pontes com as madeiras muito velhas, é uma caminhada fantástica.

Imprópria para quem sofre de vertigens, mas fantástica para quem é corajoso!

Devia lá ir FJV.

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