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Foto de grupo à saída do jantar.
Ninguém ia imaginar que Rogério Casanova fosse um dos primeiros a chegar; ainda por cima ele tinha conseguido escapar aos outros jantares de A Seita, realizados como sempre no restaurante A Licorista (Rua dos Sapateiros, 218-220). A maior parte do grupo tinha descido o Chiado (o encontro, como sempre, na esquina da Rua Nova do Almada com paragem na Férin para ver os livros da montra, e passar depressa diante da redacção do Sol). A vantagem dos jantares da Seita é que não há tema oficial, se bem que haja sempre quem recorde que Manuel Alegre também não foi ao congresso de Espinho e que não foi por isso que se deixou de falar dele. Ementa a propósito (tirando a obsessão – nenhum de nós a conhecia – de Casanova pelo bacalhau com grão; há quem diga que ele tem os cardápios de dezenas de restaurantes tradicionais lisboetas para que possa transitar de uns para outros, mantendo o bacalhau com grão como prato do dia; nunca imaginei que um leitor de James Wood tivesse essas inclinações gastronómicas, à excepção dos almoços com o Maradona no Atrium Saldanha): pastéis de bacalhau, bacalhau com natas (sim, houve uns traidores...), uma costeleta de novilho pantagruélica (uma pessoa vê caras e não vê corações), saladas de polvo, e não reparei se havia ou não iscas à portuguesa, que o João Pombeiro pedia encarecidamente ao empregado de mesa, com o aplauso de Vítor Paulino e de Rui Penedo, os designers do grupo (RPVP SA), mantidos ao largo. No grupo havia dois adeptos benfiquistas e Casanova ameaçou dançar flamenco sobre as mesas (há quem garanta que dançou mesmo, mas na ocasião vim para a rua fumar) para tripudiar Quique Flores, garantindo que tripudiar significa «saltar ou dançar batendo com os pés; sapatear, etc.». O Irmão Lúcia fez três desenhos de Isabel Coutinho (que consultou sete vezes o iPhone em busca de novidades do twitter), Helena Ramos comentou duas badanas igualmente criticáveis de livros de Nora Roberts, José Mário Silva recordou o jogo mais recente do Sporting na Liga dos Campeões, Paulo Ferreira roubava grãos ao bacalhau com grão de Casanova, que ofereceu a todos o pratinho com alho e cebola picada (Nuno Seabra Lopes ameaçou sair do restaurante se ele não parasse com a brincadeira). O resumo do jantar não ficaria completo se não referisse um quizz de bibliografia esotérica que Rogério Casanova ganhou à tangente a Sérgio Coelho (que se revelou um conhecedor muito razoável de Madame Blavatsky), e a que Sara Figueiredo Costa se furtou com o argumento de que tinha de ir consultar o iBook por causa de umas apostas sobre o acordo ortográfico (quem tinha o iBook era Isabel Coutinho). Ao ouvir mencionar a palavra «apostas», Casanova murmurou qualquer coisa indecifrável e de que só se percebeu a repetição, cadenciada, de «Updike, Updike, Updike». No final, Casanova irritou-se com José Mário Silva por causa da geografia das Hébridas, argumentando que o Doutor Johnson («We, authors.») detestava viagens («The greater part of travellers tell nothing, because their method of travelling supplies them with nothing to be told.») o que levou Margarida Ferra a recordar «eu bem te dizia, eu bem te dizia» enquanto folheava o cardápio da sobremesa (havia um doce «tipo toucinho do céu» que ganhou por nove-cinco). No final, quem quis fumar teve de vir para a rua. Rogério Casanova foi abordado por duas vezes por cidadãs suíças (havia uma convenção algures) que lhe pediam cigarros, e ele recomendou-lhes que fossem ao Animatógrafo do Rossio onde haveria Peter Stuyvesant de contrabando (não havia, caso contrário eu saberia), enquanto discutia com Pedro Vieira (o Irmão Lúcia) a sua participação em vários blogs em simultâneo; Vieira suplicava-lhe que fosse à Almedina do Saldanha dar autógrafos, mas sem resultado. No final, a meio da R. do Ouro, subi as escadinhas de Santa Justa (citando Cesário Verde: «Voltemos. Na ribeira abundam as ramagens/ dos olivais escuros. Onde irás?/ Regressam os rebanhos das pastagens;/ ondeiam milhos, nuvens e miragens,/ e, silencioso, eu fico para trás») e o grupo continuou na direcção contrária, ouvindo-se a voz de Casanova ameaçando espatifar a montra da Livraria Petrony. O meu editor bem me avisou – que me deixe de blogs e que comece a escrever. Mal ele sabe. Afinal, quem tem medo de Rogério Casanova? Olhem para ele, ali à direita, que parece saído de um seminário na Católica (há quem diga «saído de uma lecture em Glásgua»).
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