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A guerra das escolas. Um ponto da situação.

por FJV, em 12.03.08
As queixas sobre a educação encontraram agora um argumento político de força, graças à manifestação dos professores. A avaliação iria pôr termo a todos os males e levar-nos ao caminho da civilização. Mas, na verdade, a guerra contra os professores e os pedidos para que as autoridades actuem sem recuo faz esquecer o pormenor: avaliem o trabalho do Ministério nos últimos vinte anos. Não dos proprietários ou ocupantes temporários da pasta, mas dos verdadeiros donos do ME, uma classe de experimentalistas que elaboraram programas, preâmbulos a programas, ordens burocráticas e documentos sobre procedimentos burocráticos, escalas de reuniões e curricula absurdos (e que, inclusive, autorizou curricula ainda mais absurdos para valorização «profissional» de professores hábeis, muito hábeis), ausência de razoabilidade em processos disciplinares, reformas e contra-reformas curriculares ao sabor de pantomineirices (como a TLEBS, a imbecilização no ensino da Matemática, da História e da Ciência) que favoreceram a falta de cultura científica e de hábitos de trabalho dos estudantes. Esses são os verdadeiros responsáveis. Meter na escola – essa arena onde o ME sempre esteve impune e sempre defendeu a sua autoridade para impor regras e princípios sem discussão e sem participação – pais, autarquias, estatísticas, julgamentos pelos pares, inspectores sem competência científica e até gente analfabeta mas com todo o conhecimento da novilíngua ministerial providenciada por génios que raramente ou nunca deram aulas ou estiveram mais de dois anos seguidos numa escola, não é o melhor método de nos levar ao caminho da civilização.
Claro que se pode questionar uma avaliação feita contra os professores, mas essa é uma guerra fácil e cheia de armadilhas. Basta ver os blogs, de esquerda e de direita, pedindo autoridade, disciplina e avaliação. Avaliam-se resultados, sim; mas com que instrumentos, com que programas escolares, com que linguagem técnica?
A questão, aqui, não é a de dar crédito aos sindicatos ou às multidões, a de apoiar a ministra (mais uma vez, aliás, é o secretário de Estado Jorge Pedreira que vem salvar a nau...) ou a de considerar que qualquer recuo é uma derrota de José Sócrates. Outras equipas optaram por outro caminho: primeiro, tratar da matéria educativa, dos programas, dos curricula, de um estatuto do aluno sério e capaz, da chegada do rigor (esse sim) ao ensino das ciências e das humanidades – depois, tratar também da avaliação dos professores. Estranho, por isso, que tanta gente caia na armadilha.
Na verdade, esta ministra não tratou de reformar a escola, nem o ensino, nem a educação; tratou, isso sim, e com razoável eficácia, de melhorar as estatísticas e de disciplinar o funcionamento da rede ministerial (desde os célebres corredores da Av. 5 de Outubro às regras para auxiliares administrativos, comportamento de professores e de sindicalistas). Fez bem. Era um ponto. Mas a verdadeira reforma, aquela que este sistema de avaliação há-de esconder, essa não me parece que esteja a ser feita. Coisas simples: o que defende o ME sobre a utilização de calculadoras no ensino básico?; o que diz o ME sobre o programa de ensino de Português?; por que razão entrega de mão beijada o ensino da Literatura e da Filosofia?; por que razão se continua a autorizar o aumento do preço do livro escolar (vem aí, vem aí, preparem-se...)?; foram os professores ouvidos sobre as reformas curriculares? Eu queria um ME que se preocupasse com isso. Argumentarão que a avaliação é o primeiro passo para que o ME deixe de tratar todos os professores como «os professores» e passe a distinguir os bons, os maus e os outros. Mas a fazer o quê, nas escolas?

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30 comentários

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De Rui a 13.03.2008 às 06:08

Tem toda a razão, Francisco.
Veja um exemplo: a Portaria nº 42/2008 de 11 de Janeiro , Diário da República 1ª Série, nº8 :
"1.º Não há lugar à adopção de manuais escolares nas
seguintes áreas curriculares e disciplinas:
a) Expressões Artísticas e Físico -Motoras (designadamente
Expressão e Educação Plástica, Expressão e Educação
Musical e Expressão e Educação Físico -Motora) do
1.º ciclo do ensino básico;
b) Áreas curriculares não disciplinares dos 1.º, 2.º e
3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário;
c) Educação Física, Educação Musical e Educação Visual
e Tecnológica do 2.º ciclo do ensino básico;
d) Educação Física e Educação Artística (disciplina de
oferta de escola, designadamente Educação Musical) do
3.º ciclo do ensino básico;
e) Educação Física do ensino secundário.
2.º A obrigatoriedade de aquisição dos manuais escolares
das disciplinas e áreas curriculares referidas no número anterior
cessa em 2010 -2011 para os manuais de ciclo e do 5.º,
7.º e 10.º anos de escolaridade, cessando nos anos seguintes
para os manuais dos anos de escolaridade subsequentes.
3.º Nas disciplinas de Educação Visual e de Educação
Tecnológica do 3.º ciclo do ensino básico, a adopção tem
carácter facultativo, por decisão dos órgãos competentes
dos agrupamentos de escolas e das escolas não agrupadas.
4.º Nas disciplinas referidas no número anterior, tendo
a adopção carácter facultativo, a aquisição é também facultativa."
Ou seja, em todas estas disciplinas, a mensagem que passa é que os alunos estão dispensados de ter de estudar, visto que já não têm livro por onde o fazer!

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