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Talvez o sofrimento seja o grande motor invisível de toda a grande poesia: um amor perdido ou desfeito, a proximidade ou a ideia do fim, a doença, o envelhecimento, uma amizade impossível, a morte dos que nos são próximos e têm um nome colado ao nosso, um mundo em desacordo com o nosso. E, com a idade, sobrevivemos pelo corpo enquanto sobrevivermos – cada parte dele é um nó corredio, entorse, dor, prazer, ouro da criação, anestesia, sombra de uma figueira. Talvez por isso seja um dos livros que mais me acompanhou no último ano e me obrigou a imaginar uma aula de anatomia que foi também uma espécie de evangelho acerca da vida impossível. O Meu Corpo Humano, de Maria do Rosário Pedreira, ontem anunciado vencedor do Prémio Correntes d’Escrita, não pode ser lido apenas como essa passagem do corpo e pelo corpo: o corpo de que Maria do Rosário fala é uma linha que nos atravessa e nos leva tudo. Como um vento, o melhor da poesia nunca fica dito; é um sopro que só as palavras pregam em cada parte do corpo.
Da coluna diária do CM.
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