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3400 quilómetros.

por FJV, em 11.05.22

De repente, ouço-os na mesa da esplanada: “Claro que à Ucrânia lhe interessa esta guerra.” Este, que é mais velho, faz um ligeiro ruído a sorver o café, mas deixa cair a bomba onde melhor lhe convém: “E nós aqui, pá. E nós aqui a aturar a Ucrânia, pá.” O mal das esplanadas é que se ouve quase tudo e a maior parte das coisas nem sempre é agradável. “Quero lá saber do Donbass”, diz o outro. Ninguém quer. O Donbass fica longe e a maior parte de nós ouviu falar daquela tira de ruínas só em fevereiro passado, sete anos depois de a Rússia entrar na Crimeia como se repetisse o gesto de há 234 anos, quando as tropas do marechal Potemkin ocuparam o terreno, expulsando os otomanos. Na altura, o primeiro oficial a entrar na praça militar de onde se dominava o Mar Negro era português e chamava-se Gomes Freire de Andrade, aventureiro e homem de grandes gestos que terminou enforcado em Portugal. Kiev fica a 3400 quilómetros de Lisboa; é natural que os meus vizinhos de esplanada sejam abjetos. Pode-se ser abjeto a 3400 quilómetros da Ucrânia. Mas tem sempre um custo tremendo, como se vê – um dia vem o Putin.

Da coluna diária do CM.

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