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Guerra na gastropolítica.

por FJV, em 21.02.22

Em França, foi um dos temas mais “fraturantes” da campanha presidencial em curso: o candidato comunista, Fabian Roussel, disse uma coisa simples: “Um bom vinho, uma boa carne, um bom queijo – é a gastronomia francesa. A melhor forma de a defender é permitir que os franceses possam desfrutá-la.” Protestos imediatos à esquerda – porque “a França” é um conceito ideológico ultrapassado e porque é necessário integrar a gastronomia “de um ponto de vista ecológico e social”, porque nem toda a gente ingere queijo, vinho (e logo vinho!) e carne (e logo carne!) e, finalmente, porque essa declaração pode bem ser direitista. E protestos na direita, sobretudo à roda de Macron, que também quer ser tolinha como os “wokes”, e diz que não existe gastronomia francesa mas “gastronomia em França”, muito multicultural. Roussel diz uma verdade elementar: a gastronomia é a alma de um povo, sobretudo um direito dos mais humildes, e deve ser de qualidade e acessível a todos. Que tenha sido atacado pela esquerda “moderna” diz bem de como os grandes combates podem nascer de coisas elementares. Aprendam.

Da coluna diária do CM.

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Anfiteatro Anatómico ¶ Tony Soprano e a saúde mental.

por FJV, em 21.02.22

Tony Soprano ficou deprimido quando os patos, abandonando a sua piscina, levantaram voo, sobrevoaram a copa das árvores e partiram para sempre. Foi nessa altura que teve o seu primeiro ataque de pânico (e desmaio), o que o levou a procurar a ajuda da Dra. Jennifer Melfi, uma psiquiatra. Quem viu a série de televisão sabe que tudo isto é verdade. 

Mas o mais surpreendente foi a circunstância de Tony Soprano, chefe da máfia, recorrer a uma psiquiatra e tomar Prozac. Há outro caso na genealogia do crime organizado: no filme Analyze This (Uma Questão de Nervos), um colega de Soprano, Paul Vitti (Robert De Niro), tem de recorrer aos serviços do Dr. Ben Sobel (Billy Crystal). Na altura não se falava de “saúde mental” – mas hoje a expressão serve para quase tudo. Ouço-a pelo menos duas vezes por dia, tirando as alturas em que os vários especialistas da televisão têm de comentar um desvario e, não sabendo como catalogá-lo, usam o precioso guarda-chuva de “saúde mental”. A “saúde mental” deveria preocupar-nos porque atinge uma larga faixa de portugueses, sobretudo em idade madura, e os deuses sabem como isso é dramático, triste e inevitável. Mas não devia confundir-se a melancolia, as várias decisões erradas ou a incapacidade em enfrentar a rejeição com “um problema de saúde mental”. 

A arte de sobreviver é das mais subvalorizadas. Infelizmente, estão em alta os curandeiros que dizem o que parece soar melhor ao sentimentalismo corrente – que há sempre culpas a distribuir pelos outros e que todos somos crianças indefesas e insatisfeitas que a vida traiu. Soa melhor e há quem verta uma lágrima. Tony Soprano vê os patos a levantar voo e descobre que não voltam. É isso que as pessoas com juízo percebem: há coisas que partem e parte de nós vai com elas – ou não. Isto não é um problema de “saúde mental”.

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