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O livro de Sheera Frenkel e Cecilia Kang sobre o universo Facebook (Manipulados, publicado pela Objectiva) é uma poderosa investigação sobre aquele domínio das chamadas “redes sociais”. Em relação ao tema, orgulho-me de duas coisas: 1) não tenho Facebook; 2) nunca escrevi “redes sociais” sem usar aspas. O que o livro tenta honrosamente demonstrar é uma evidência fácil de verificar à distância: o negócio de dados sempre esteve na mira do Facebook como uma das suas principais motivações. É esse negócio que permite o funcionamento das GAFAM, as gigantes da net: Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft. O livro fornece abundantes pormenores sobre a empresa de Zuckerberg (e do génio Sheryl Sandberg) – mas o problema é que se trata de um processo irreversível: de desumanização, roubo de identidade, viciação e adição, valorização bolsista e combate à escala global. As GAFAM têm um poder incalculável; tanto comandam a correção política pateta de hoje, como as nuvens da indústria da imaginação. Os seus algoritmos são o verdadeiro pesadelo de Orwell. Só lhes falta entrar no negócio prisional.
Da coluna diária do CM.
Coisas que o tempo devora: o encontro com os outros, por exemplo. Estávamos num jantar carioca (Lúcia Guimarães no intervalo de novaiorquina, Luciana Villas-Bôas – que viria a ser minha editora no Brasil –, Olívia Hime, Ana Lúcia, Sérgio Augusto, de que tinha acabado de ler Lado B e o maravilhoso livro sobre o Botafogo (Entre o Céu e o Inferno), etc.) e de repente ele entra. Era o vizinho (acho que ele tinha fome), ou seja, era Arnaldo Jabor. Cousa mais divertida. Mal eu chegava ao Rio, comprava uma sacola de livros e lá estava Amor é Prosa, Sexo é Poesia, o livro que Jabor acabara de lançar. Eu tinha visto Toda a Nudez Será Castigada ou O Casamento (adaptações de Nelson Rodrigues, o grande reaccionário) e também Eu Sei Que Vou Te Amar, seus filmes – mas gostava dele como cronista, zangado e irónico, patife, com ar de saber de tudo (e sabia). Arnaldo Jabor (1940-2022), desbocado e culto, era um símbolo daquela geração de pessoas livres do Brasil, e eu queria entrevistá-lo na época. Não deu. Ele dizia coisas de um passageiro preguiçoso: "Andamos com fome de beleza em tudo.” Morreu ontem em São Paulo.
Da coluna diária do CM.
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