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A imprensa lusitana despertou da sua letargia cultural e transcreveu ontem os respingos de um texto da agência Lusa sobre um “trabalho de investigação” realizado por uma aluna de doutoramento EUA – acerca da “linguagem racista” de Os Maias. Melhor, como os jornais decretaram ontem, “passagens racistas” do romance. Trata-se, claro, de uma imbecilidade, tomar diálogos irónicos e facetos de João da Ega ou fragmentos e referências igualmente irónicas como exemplos do “racismo” de Eça. Que uma aluna de doutoramento de uma universidade de americana mostre a sua ignorância acerca do que são a literatura ou a ironia e fale de “instrução culturalmente responsável” (só isto já merece gargalhada), não é escândalo num mundo de tolinhos. Mas é notável que um representante da Associação de Professores de Português, escutado a propósito, diga serem evidentes “os preconceitos raciais presentes em Os Maias e em outros textos de Eça”. Além de ser falso (basta procurar nas suas cartas), é mau que um professor de português não distinga ironia, literatura, antonomásia ou catacrese. Caiam do céu as bigornas.
P.S. - João Pereira Coutinho escreveu sobre o assunto um belo artigo na Folha de S. Paulo; nele, diz que a única raça que Eça desprezou era “a sua”. Algumas pessoas não entendem a ironia, de novo. Vem no João da Ega, precisamente, quando no (ia a escrever “célebre”, mas tudo em Os Maias é célebre) jantar em honra do Cohen ele se põe aos gritos: “A pior raça da Europa!” Não conhecia, ainda, a nova vaga de investigadores de literatura.
Da coluna diária do CM.
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