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Parece adquirido que Amália da Piedade Rebordão Rodrigues nasceu mesmo a 1 de julho de 1920 – mas os papéis do registo civil são como são e apresentam a data de 23. Completa hoje 100 anos de idade. “Completa hoje” e não “completaria hoje” porque é impossível anunciar o seu desaparecimento; a sua voz continua a ser a nossa voz. Mesmo isolando-a de um género musical, o fado, Amália será sempre o fenómeno, a dúvida, o mistério, a grandiosidade, a biografia escondida e desocultada aqui e ali. Amália sabia que a sua grandeza também tinha a ver com os mistérios que acompanharam a sua biografia – mas nada ultrapassa a nossa perturbação diante da sua voz (“o grão da voz”), o milagre da sua representação, a sua presença em cada poema cantado, em cada poema que escreveu. Não era apenas “a fadista”. Era o mistério da sua voz, transportando uma melancolia única, uma alegria escondida e fugaz, um gosto pela elevação, um desejo incompreendido. Por isso não faz sentido isolar essa voz do que ela significou e significa para quem, alguma vez, se sentiu português mesmo por engano. Ela é todas as nossas ilusões.
Da coluna diária do CM.
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