Bernardo Bertolucci é um dos herdeiros e obreiros do cinema clássico; talvez por isso pudesse emprestar um brilho raro a filmes como o seu O Último Imperador, que aos olhares mais distraídos parece uma montagem de Hollywood. Mas não é. Mural de história e de drama, tem atrás de si Antes da Revolução (muito bom) ou O Conformista (menos) para não mencionar a adaptação de O Céu Que nos Protege, de Paul Bowles, transformado em Um Chá no Deserto, onde há momentos de uma beleza demorada, densa, literária, tanto arrancada ao livro como à tensão de uma relação amorosa desfeita. Pelo meio há O Último Tango em Paris, menor, mas muitos não lhe perdoam La Luna, outro vitral luminoso, mas anti-romântico, em redor do incesto; sinceramente, nada ultrapassa a saga de 1900 — um díptico comunista sobre os tempos do fascismo e da revolução imperfeita. O filme é grandioso, tanto quanto irreal a sua leitura da história, forçada para construir um elemento heróico (o povo que resiste ao fascismo), ordenador e disciplinador da História. Mas a beleza dos seus filmes é um pilar bem assente e duradouro. Para lá da morte.