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Como não sou um ouvinte regular de fado, o nome de Celeste Rodrigues foi para mim, durante muito tempo, apenas o da irmã de Amália. Erro crasso. Nos últimos anos li três ou quatro entrevistas suas – e foi uma descoberta. Havia ali um despudor, um atrevimento, uma independência de caráter que ultrapassava de longe aquele laço familiar. Língua afiada (como a de Beatriz da Conceição, um demónio em chamas) e, no entanto, uma serenidade sem cedência na maneira de pensar. E uma memória que traduzia uma vida vivida. Pus-me a ouvi-la; “Tu Não me Digas”, “Meu Corpo”, “A Lenda das Algas” ou “Na Esquina da Minha Rua” bateram fundo – talvez aquilo fosse o fado de antanho (que eu desconhecia), genuíno, aquela ironia no grão da voz, qualquer coisa que arranhava um pouco e deixava um sulco, um eco numa sala silenciosa. Lamento não ter sido seu admirador em devido tempo. O fado passa-me ligeiramente ao lado; mas de entre as canções que hei-de recordar há de contar-se uma de Celeste Rodrigues como um sinal de qualquer vida eterna e de um destino invulgar em que poisou o talento. Ouçamo-la.
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