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Dar à luz sem epidural, ir ao dentista sem anestesia – há um mundo de coisas magníficas e saudáveis na “vida natural”, sem medicamentos nem químicos, vivendo como recoletores, apanhando a fruta do chão e recusando-se a usar champô. Uma delas é o risco, em sentido lato, que parece não incomodar os pais que se recusam a vacinar os seus filhos e que preferem (li isto numa reportagem) que o filho “tenha a doença mas não a vacina”. Sarampo, poliomielite, tosse convulsa, a lista de vacinas é vasta, o nosso terror durante a infância há quarenta, cinquenta, sessenta anos. Compreendo que pais comprometidos com a “vida natural” e a recusa em usar químicos de qualquer ordem – sobretudo ligados à indústria farmacêutica – sujeitem a sua família a este risco. Dá um trabalho considerável, mas compreendo a dedicação integral de certas pessoas empenhadas em regressar a um paraíso que já não existe há muito, onde se pode ser vegetariano, detestando a anestesia, a aspirina e a proteção contra o sarampo. Compreendo; mas parece-me idiota viver no meio do perigo.
Os polícias e moralistas da literatura não ficarão muito satisfeitos com o Grande Prémio de Poesia para Helder Moura Pereira; tanto melhor. Trata-se de um dos nossos grandes poetas (e tradutor notável, de grande mérito). Não só, evidentemente, por este livro, Golpe de Teatro (Assírio & Alvim) – mas por uma das obras mais consistentes da poesia portuguesa do último quartel do século XX e estas duas primeiras décadas do atual. Nada nos pode dar mais alegria do que ver este prémio da APE distinguir um autor como Helder Moura Pereira (n. 1949), a mão que assina livros tão importantes como Carta de Rumos, Nem por Sombras, Mútuo Consentimento, Lágrima, o mínimo Eu Depois Inventei o Resto, sem deixar de mencionar a sua participação no histórico Cartucho (de 1976, com três grande poetas: Joaquim Manuel Magalhães, João Miguel Fernandes Jorge e A. Franco Alexandre), inesquecível. Leiam os seus poemas, um relâmpago de harmonia: “Mantêm-se as causas iguais /das pequenas alegrias, longe da alegria, a rotina /dos sorrisos vem de nenhum vício. Este abandono / custa.”
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