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O saudita Raif Badawi foi condenado a uma pena de mil chicotadas por ter denunciado no seu blog as limitações à liberdade de expressão que existem no país (que já vai com 87 condenações à morte, executadas). O facto passaria ainda mais despercebido no meio de outras atrocidades do Médio Oriente não fosse dar-se o caso de, esta semana, o embaixador saudita em Genebra, Faisal Trad, ter sido eleito presidente da equipa de peritos independentes no Conselho de Direitos Humanos da ONU que definirá o próprio conceito de Direitos Humanos. Não se sabe o que fará este painel de especialistas, mas certamente receberá conselhos importantes da China, da Rússia, de Cuba, dos Emiratos Árabes, que também pertencem à agremiação. Não se sabe por que razão o ocidente rosna tanto sobre Direitos Humanos e aceita esta abjeção.
Consequências de tudo isto? Bom. A Arábia Saudita quer, mesmo, presidir ao Conselho de Direitos Humanos da ONU – na mesma altura em que planeia crucificar e decapitar Ali Mohammed Baqir al-Nimr, preso com 17 anos.
Mao-Tse-Tung (à direita) e um traidor à esquerda – que depois desaparece na foto com o beneplácito
da Comissão Nacional de Eleições.
Lamentavelmente, nunca fui militante de um partido revolucionário (como quase todos os meus colegas de turma na universidade), mas o MRPP faz parte do folclore da minha adolescência. Um dos meus sonhos era conhecer Arnaldo de Matos, “grande educador da classe operária” – quando lhe apertei a mão, pude verificar que era uma pessoa cordata, risonha e que nunca executaria nenhum dos fuzilamentos pedidos pelo seu partido em 1974 e 1975. Vem a isto a propósito de o MRPP ter retirado da sua campanha a frase ‘Morte aos traidores’. Que desilusão. O MRPP até podia pedir a morte do João Ratão, que ninguém levava a mal; era uma força de expressão (já Mao Tsé Tung executou milhões). Mas a CNE, que superintende as eleições, diz que não havia problema porque os visados, “os traidores”, não se queixaram. Nem inventado se conseguia isto: um grupo que pede fuzilamentos e um organismo do Estado que diz que não faz mal.
«Categorias como a capacidade intelectual do povo, o acto eleitoral e a democracia dependem de 1%.»
Há um ano, o arcebispo de Cantuária admitiu que os muçulmanos britânicos aplicassem a ‘sharia’ entre eles. Esta pérola de ‘tolerância multicultural’ ocorreu-me ao ler algumas mensagens do twitter de Reyaad Khan, abatido há semanas durante um ataque inglês no mapa do Estado Islâmico: “Ontem executei bastantes prisioneiros”, “hoje assisti à mais longa decapitação de sempre”, ou “talvez a Gucci queira patrocinar o meu cinto de explosivos”. Khan não foi criado nas montanhas do Paquistão ou no deserto iraquiano; foi educado em escolas inglesas e sonhava ser o primeiro chefe de governo asiático do Reino Unido. Em 2013 rejeitou um convite para estudar na universidade de Medina, Arábia Saudita, e preferiu ir para a Síria, combater ao lado do EI e expulsar infiéis do território do califado. Respirava multiculturalismo europeu.
A Europa inventou o “bom selvagem” e, depois da II Guerra, criou o “bom revolucionário”. Ambos habitariam na América Latina. Perdidas as ilusões em relação ao “bom selvagem”, a boa consciência europeia, sempre à esquerda, limitou-se a apoiar todas as revoluções locais. Hoje, quando ninguém de bom senso dá vivas à revolução cubana (eu disse “de bom senso”), a Venezuela passou a ser o paraíso: uma pantomina permanente, na esteira do melhor estilo caudilhista, fechando televisões e jornais, inventando uma religião, aumentando os pobres, destruindo a economia, esvaziando as lojas e enchendo as prisões com condenados por tribunais revolucionários. O Podemos, o Syriza e o novo líder trabalhista inglês, Jeremy Corbyn, adoram a Venezuela. É o seu modelo. Aí está um tema de reflexão, quando se trata de fazer escolhas. Ou alguém ainda se lembra de Leopoldo López, que acaba de ser condenado a uma pena de 13 anos depois um julgamento fantoche?
Uma pessoa faz um voo da Sata — atrasado à partida. Alguns anos depois, após muitos voos razoavelmente a horas, volta a fazer um voo da Sata. Atrasado. Ao meu lado está uma senhora a ler Mude a Sua Vida com a Auto-Hipnose. Aviso que não resulta, pelo menos com a Sata.
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