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Matéria de romance pode ser esta, e os cenários vão do Porto a Bagdad e Xangai, passando por Singapura, por Tânger e pelas montanhas do interior de Portugal. Protagonista: o capitão Barros Basto (1887-1961), aliás Abraham Israel Ben-Rosh, foi o fundador da sinagoga Kadoorie Mekor Haim, uma obra notável que os portugueses desconhecem, e que domina a R. Guerra Junqueiro no Porto: Mekor Haim significa “fonte da vida”; Kadoorie é o nome de um judeu iraquiano que contribuiu decisivamente para a sua construção (Sir Elly Kadoorie mudou-se de Bagdad para Bombaim e daí para Hong Kong, onde viria a morrer num campo de prisioneiros japonês da II Guerra – o seu túmulo, em Xangai, foi estranhamente poupado pela ‘revolução cultural’). Singapura porquê? O primeiro rabino da sinagoga do Porto foi afastado para Bragança, daí para Port Said, no Egipto, e depois para Singapura, onde morreu e repousa. As montanhas de Trás-os-Montes e da Beira foram percorridas pelo capitão Barros Basto (cuja conversão ao judaísmo se fez em Tânger, porque a comunidade judaica de Lisboa a recusou) resgatando judeus portugueses a que a Inquisição impôs uma vida clandestina desde o século XVI – antes de o exército português o expulsar em 1937. A Kadoorie Mekor Haim, sede da comunidade judaica do Porto, é a maior sinagoga da península. Assinalaram-se no domingo os 75 anos da sua construção – é um património que devíamos festejar.
Somos europeus até certo ponto. Daqui em diante, nada. Explico em cinco ou seis linhas: pretendem os burocratas de Bruxelas que o bacalhau comercializado nos países da União Europeia fique sujeito a tratamento com polifosfatos que podem alterar o sabor, a textura e a qualidade do bacalhau que, como sabemos, é um dos símbolos da nossa identidade nacional. Juntar químicos ao bacalhau em vez de deixar que o salguemos como nos apetece, e de o comermos como acharmos melhor, é um atentado, uma intromissão e um crime, tudo junto. Bruxelas já cometeu vários crimes desta natureza – porque lhe apetece, porque tem poder para isso, porque se está nas tintas. O que o governo português deve fazer: vetar, bloquear, esbracejar, impedir. Uma coisa é sermos europeus, outra é estarmos dispostos a que nos mexam no prato e nos alterem a ementa. Não estou a brincar; é um caso sério de identidade nacional.
[Da coluna do Correio da Manhã]
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