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Primeiro verso: «She was born in November 1963, on the day Aldous Huxley died.» Curiosamente, foi também o dia da morte de C.S. Lewis. Curiosamente, foi ainda o dia da morte de J.F. Kennedy.
O assassínio lento a que a FPF e o governo (através da autoridade das dopagens e do seu instituto do desporto) sujeitam Carlos Queiroz devia merecer alguma reflexão, para além do futebolês mais imediato — e das duas pequenas catástrofes esperadas contra o Chipre e contra a Noruega. O timing, claro. Mas também o segredo guardado para poder encostar Queiroz à parede. A desrazoabilidade das decisões, o ridículo do processo e da sua montagem, além do poder absoluto conferido a autoridades que estão acima da lei, tudo isso é um absurdo que leva, também, a estes resultados. Já não me interessa saber se Queiroz tem razão ou não, se o espalhafato moral tem motivos ou não para seguir adiante — como foi possível manter no poder esta merda de bonzos (as autoridades à solta, os senhores da FPF, etc.) é que me inquieta. Ou não. No fundo, já estamos sem resistência.
Jean-Luc Godard anunciou que não vai a Hollywood receber o Óscar honorário (nesta edição também atribuído a Coppola e a esse extraordinário actor que é Eli Wallach). Há um pouco de arrogância francesa na sua decisão, mas compreende-se que aos 79 anos Godard pode decidir onde vai e onde não vai. Acontece que a Academia decidiu que havia duas cerimónias – a dos Óscares e a dos Óscares Honorários, atribuídos a figuras incontornáveis do cinema; ou seja: para não “atrapalhar” a atribuição televisiva dos Óscares, realiza um jantar, discreto e onde não aborrece a indústria, onde homenageia as “figuras do cinema”. Ao ‘show business’, tudo; ao cinema, um jantar sem televisão em direto. Godard faz bem em torcer o nariz. Ou é Óscar ou não é Óscar. Ou é cinema ou não é cinema.
[Na coluna do Correio da Manhã.]
A larguíssima maioria das minhas viagens de inter rail (muitas) foram nos países nórdicos, aos quais devo muito. Da ponte entre Puttgarden e Rødby (da Alemanha para a Dinamarca) até Svalbard, no mar de Barents, das ilhas Lofoten (em Stamsund, onde nasceu Liv Ullman) até à Karelia, suecos, noruegueses, dinamarqueses (e um pouco finlandeses) mostraram-me muito sobre várias coisas. Mas o que achava mais admirável era uma espécie de culto da frugalidade, que não (não, não) tinha apenas a ver com a tradição ou formação religiosa. Tinha a ver com a vida e a maneira de encará-la. Pensei nisso ao ver uma parte do jogo entre a Noruega e Portugal: as placas electrónicas ao longo das linhas laterais (as mais caras) passavam publicidade portuguesa. Havia umas excepções nas linhas finais, junto às balizas, e só de vez em quando. De repente pensei que estava a ver um jogo transmitido, imaginemos, da Albânia ou da Roménia (cujas empresas não têm dinheiro para comprar espaço em emissões internacionais). Não. Tratava-se da Noruega, onde as empresas são sólidas, onde os salários são altos e onde quase tudo «da indústria do lazer» é caro (restaurantes, bares, hotéis) e bom. Onde até a publicidade é cara. E boa.
Pensei também numa dessas viagens, a norte de Bergen (Ibsen, Peer Gynt, Grieg, etc.), junto dos lagos e fiordes. «Intocado», disse, olhando à volta. Nenhuma auto-estrada (além dos barcos, apenas uma pequena estrada – que aqui se chamaria «florestal» – e uma linha de caminho de ferro para um comboio lento e «turístico»). O meu companheiro de viagem, Jan, que era professor em Oslo (nascido em Bergen), explicou: «É. As pessoas gostam disto. É essa a razão.» Também me lembro da casa dos seus pais, do velho casaco de lã do pai, dos vasos com cidreira transplantada de Espanha, da sala de estar com uma maravilhosa biblioteca e viagens (o único lugar, digamos, exibicionista), do bolo feito em casa, da cerveja de Solvær, do carro com doze anos, da bicicleta enferrujada (o pai e a mãe ainda a usavam para irem até à beira do lago). Fiquei três dias, antes de subir para Bodo, Narvik, Trømso; não fomos jantar a restaurantes, não havia shoppings. Por isso pensei agora nas placas de publicidade. Não querem dizer nada, evidentemente, e talvez isso signifique que a nossa economia esteja a transbordar de energia, de bolsa farta para investimentos, mas, além de ser feia e chinfrim (aquelas cores, aqueles logos), pensei na sobriedade norueguesa, nas casas suecas, na ausência de placas de publicidade.
Um imposto mais, e de graça? A formulação de Durão Barroso, a ser correcta, é suficientemente clara: a UE precisa de dinheiro — os contribuintes estão aí.
O roubo da carrinha dos Xutos & Pontapés é uma história de rock’n roll, boa para ser contada por Nick Hornby ou Tony Bellotto. Transformar-se-ia num verdadeiro delírio: horas antes de um concerto, a banda de rock mais popular fica, de repente, sem guitarras, bateria, material de som. O argumento poderia, aqui, seguir vários caminhos: os ladrões poderiam ser fãs de Julio Iglésias ou fadistas de Santarém, com motivações estéticas; mas também poderiam ser ‘groupies’ invejosas (fanáticas dos Delfins), ou, melhor ainda, ecologistas radicais de Montemor-o-Velho. A guitarra de Zé Pedro apareceria, desmontada, no Museu de Arte Antiga – e a bateria seria oferecida, aos pedaços, a uma filarmónica de Ponte de Lima. Salvavam-se o cachecol de Kalu, evidentemente, e os óculos de Tim.
[Na coluna do Correio da Manhã.]
Não quer dizer nada. De facto, ser pelo progresso não quer dizer nada. José Sócrates, em Matosinhos, anunciou o slogan A Força do Progresso, acrescentando-lhe o interessante motivo para apoiar Manuel Alegre: «Porque tem uma visão progressista para o país.» Melhor do que isto só ver disparar o desemprego, diminuir os apoios sociais, aumentar os impostos, endividar os próximos anos das nossas vidas, acabar com o ensino recorrente, transformar o ensino público numa fábrica de mediocridade (malbaratando o dinheiro dos contribuintes em experiências pedagógicas que daqui a alguns anos terão de ser dramaticamente corrigidas), enriquecer (ao desbarato e forma dúbia) as grandes empresas amigas, velar para que as leis sejam uma coutada dos poderosos, atribuir subsídios a empresas mal geridas, associar-se a patifes (Kadhafi, Mugabe e Chávez) para tentar negócios que nunca se farão — e ter a lata de vir falar em Estado Social.
«Ser contra o progresso é ser conservador? Não. É ter juízo. É ter cautela.»
João Villalobos, no Albergue Espanhol.
Klaxons, «Gravity’s Rainbow»
[Sugestão do Rui P. J.]
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