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Pedro Mexia abandonou o cargo de sub-diretor da Cinemateca Portuguesa. É pena – independentemente da continuidade de Maria João Seixas. Mexia trabalhou com João Bénard da Costa e era visto como uma espécie de herdeiro de “uma certa visão do cinema”. Poeta, ensaísta, uma das poucas pessoas que, com sobriedade e cultura, pensa a política em Portugal, Pedro Mexia tinha uma vantagem nada negligenciável para o seu cargo: estava longe dos grupos de pressão do “cinema português” e tinha da Cinemateca uma visão que se adequava ao estatuto da própria instituição. Ou seja, não via a Cinemateca como uma “vanguarda” ou um “pátio da atualidade”, mas como um verdadeiro museu do cinema. Esta perspetiva não agrada a muita gente, mas é pena. Porque é a mais acertada e a mais nobre.
[Na coluna do Correio da Manhã.]
O nome das ruas é um assunto tremendo e as comissões de toponímia deviam ser mais escutadas e mais bem preparadas. E também devia ser estudada a quantidade de ruas que muda de nome consoante as mudanças na política. No Porto, o executivo da Câmara não atendeu uma proposta para atribuir o nome de José Saramago a uma rua da cidade (não sei qual). À partida, a decisão é má. Se Saramago fosse propriedade de um partido político, compreendia-se; mas trata-se do nosso Nobel da literatura, e provavelmente irá ficar na história com mais justiça do que qualquer um dos políticos vivos que já têm o nome inscrito na toponímia nacional. Requer-se um certo distanciamento. Não só de tempo. Também de juízo crítico. Eu também não gosto muito de Manuel Fernandes Tomás, mas é a vida.
[Na coluna do Correio da Manhã.]
E, na verdade, o Francisco Mendes da Silva tem toda a razão. Exemplos e fundos não faltam.
Manuel Alegre dispara em todas as direções. Vai descontar 20% dos seus rendimentos para um fundo de auxílio à pobreza, para agradar ao sr. D. Carlos Azevedo. Vai defender uma estrututa militar na CPLP para resolver os problemas da Guiné (isso é que vai ser...), para irritar o dr. Cavaco. Vai defender a proibição de revisão constitucional, para tentar agradar ao BE e ao PS. Podem começar a colecionar as declarações e fazer um quadro comparativo daqui a quatro meses.
Tomás Vasques põe o dedo na ferida a propósito das discussões sobre a revisão constitucional: o país fervilha de constitucionalistas que defendem a Constituição porque passaram anos a estudá-la («anos de estudo da matéria»). Na verdade, devemos temer muito este reaccionarismo dos que acham que não se pode mexer na Constituição, como não se deve mexer nas cores da bandeira ou nas estrofes do pobre hino. A querela em torno dos poderes presidenciais, então, é a mais ridícula de todas — porque já se sabe que, até agora (a esta proposta), a discussão foi encomendada à medida dos interesses imediatos. Os proprietários da Constituição servem-se de uma aura que detêm com abnegação — a de serem proprietários da Constituição, de se recordarem do hemiciclo, dos bravos combates por um artigo ou da negociação por outro, num heroísmo de fantasmas. Mais uma vez, um pouco de estudo do século XIX (e do período 1820-1850) seria da máxima utilidade. Convenhamos: muita gente acha que não se deve mexer na Constituição apesar de a Constituição não ser adequada, porque — precisamente — se mete onde não é chamada. Compreende-se o princípio, o de não se poder proceder a revisões periódicas da Constituição sob pena de o texto perder o que lhe resta de honra, dignidade e princípio. O problema é que os seus princípios estão errados, a sua dignidade está ferida e a sua honra já ninguém lha reconhece. A Constituição foi o produto de um processo revolucionário e as revisões posteriores não lhe retiraram essa marca. Tomás Vasques acha que há uma discussão política & ideológica que vale a pena travar em torno da Constituição e que não se pode reduzir a questões técnicas. Tem razão. Uma das coisas que há a fazer é tentar que o seu texto seja respeitado por todos os portugueses. Para isso, o melhor caminho não é mudar os as opiniões, as orientações políticas e as opções dos portugueses — mas transformar a Constituição num texto útil, mais neutro, de garantias mínimas ou máximas, essencial. Agora, esta ideia peregrina de que os senhores professores se dedicaram a «anos de estudo da matéria» é verdadeiramente para fazer rir. Azar.
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