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Há uma mania portuguesa que é a de repente, muito direitinhas, em bicos de pés, soturnas e de narinas indignadas, aparecerem umas figuras a fazerem figura de guardiãs da decência. Por exemplo: mandar calar alguém – «o senhor presidente não pode comentar nem pronunciar-se, bla bla», «o senhor deputado não pode bla bla», «o senhor jornalista não deve bla bla». Há exemplos de figuras assim. Desta vez, a indignação chocada diante do silêncio de Rui Pedro Soares é comovente. A um grupo de deputados pareceu-lhe até que a República estava em perigo, e houve quem pensasse em mudar não sei que disposições legais, ou leis – para obrigar Rui Pedro Soares a falar. É preciso dizer que não conheço Rui Pedro Soares nem tenho simpatia pelo que parece que eram as suas funções e pelo que é quase certo que fez – mas se quiser manter-se em silêncio, está no seu direito. Não quer prestar declarações? Não preste. Não quer falar sobre as escutas? Não fale. A imprensa protesta? Que proteste. Os deputados indignam-se? Faz-lhes bem. Há imposições legais? Que se apliquem. Mas determinar, assim de repente, o fim do direito ao silêncio, é de uma indignidade só admitida num país de pequenos regedores.
PS - É claro que Rui Pedro Soares falou. Naquelas pequenas e curtas frases, escorregou. Nem precisa de falar, foi claríssimo como a água.
O Dia Mundial do Livro não é uma efeméride — é, antes, uma convenção. É por isso interessante que o governo tenha discutido este problema — o da isenção de IVA para ofertas de livros em stock, que de outro modo estariam condenados ao massacre. A idenção de IVA por ofertas de livros ao Estado é, por outro lado, ligeiramente estapafúrdia; não como princípio, mas porque não se entende que o Estado cobre IVA sobre as transações normais e depois possa ainda beneficiar de ofertas dos editores. Teoria da conspiração: o Estado deixa de comprar livros para as bibliotecas públicas e escolares, mas fica a aguardar as doações. No meio de tanto dinheiro gasto no «combate à iliteracia» (pelo menos, no papel), seria bom que as contrapartidas fossem mais significativas.
É muito comovente e justo que o Estado fale de massacre em relação à destruição de livros em armazém; convinha, no entanto, criar algum incentivo para a oferta de livros nessas condições (a desoneração fiscal é uma delas), coisa que o Estado, está quieto.
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