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De repente, à esquerda e à direita surge uma onda de solidariedade com “as vítimas” do desastre financeiro que está à vista. Os mais “solidários” voltam-se contra o Congresso Americano que desobedeceu aos chefes partidários e achou que não devia aprovar o plano de salvamento que lhes era proposto lá de cima. Os “solidários” acham que é egoísmo não querer dar uns dólares ao vizinho. O problema é que não se trata de “uns dólares” – são, pelo menos, 2500 por cada cidadão americano. E não é ao vizinho – mas sim aos bancos que usaram e abusaram do risco. Não é preciso perceber de economia para saber que são os contribuintes que vão pagar a despesa; por isso, a falência desses bancos não me parece mal. Se é preciso aplicar o dinheiro dos contribuintes, há muito por onde começar.
[Da coluna do Correio da Manhã.]
Para já, a crise financeira chega a Portugal como um eco de falências e turbulências na bolsa. O “cidadão médio”, no entanto, faz contas. E são simples: afastado da ribalta da grande especulação, limita-se a recordar as aulas de contabilidade salazarista, que é a mais apropriada para o seu caso – não pode gastar mais do que ganha. Bem vistas as coisas, pela lógica dessa contabilidade, também os bancos não podiam emprestar mais do que tinham, para que os clientes não pudessem dever mais do que podiam. O alto capitalismo vive na corda bamba, o que é bom para grandes contas e riscos incalculáveis, mas fatal para a economia de quem vive com decência. E é isso: o “cidadão médio” faz contas: deve o telemóvel, parte da casa, parte do carro, parte das férias. Ou seja, aprende o que já sabia – que um almoço nunca é de graça.
[Da coluna do Correio da Manhã.]
Não há argumentos nem desculpas que justifiquem o escândalo. O problema do escândalo é que o escândalo se limita a escandalizar, toda a gente vem gritar para o meio da rua, as virgens ajeitam os xailes e a coisa fica por aí (e, como diz Vital Moreira, a arbitrariedade acaba por ser premiada com a impunidade)... Por exemplo, os jornais anunciam que há 3000 casas atribuídas de forma arbitrária; conhecemos alguns nomes, que servem de bode expiatório e que cobrem a generalidade das presidências da autarquia nos últimos anos. Krus Abecasis, como está morto, é o candidato a maior culpado; mas eu agradecia que os jornais investigassem mesmo os nomes dos jornalistas, por exemplo, que vivem em casas cedidas pela Câmara e não se limitassem a crucificar Baptista-Bastos.
Sim, eu posso ter maus fígados mas, aos 73 minutos, quando aquele mexicano do Arsenal entrou pela área do FC Porto aos toques, eu desatei a rir – só parei quando vi, pela televisão, que Arsène Wenger tinha feito o mesmo e pelas mesmas razões. Estava irritado pela chamada de Lucho, fragilizado e sem ritmo, incluído numa equipa trôpega, sem alma, sem laterais (ia escrever «sem defesa e sem ideias para o ataque» mas pareceu-me muita coisa junta) – só por maldade ou por distracção se poderia exigir o talento de Lucho para organizar uma banda desafinada e sem capacidade de fazer marcações, sem falar do buço do Tomás Costa (um magricela que até não esteve mal na ala direita mas, para todos os efeitos, um jogador que cumpre mandar recolher a um sanatório para engorda e musculação), do desequilíbrio daquele rapaz que veio do Benfica (substituído inutilmente pelo Candeias, que não tem culpa) ou da inutilidade de Benítez (sempre batido por Walcott, que também bateu Bruno Alves limpinho). Quanto a Helton, eu proibía-o de jogar de calças; basta lembrar Krajl, outro guarda-redes de calças compridas – completamente disfuncional – que passou pelo FC Porto como capataz de aviário. E quanto aos semi-golos de Lisandro e de Rodríguez, é justo dizer que não passaram de bolas que não entraram. Quanto a Jesualdo Ferreira, o projectista, não percebo. As coisas são como são.
ראש השנה. Ano novo neste calendário.
A partir de hoje, às 18h30, Manuel Alberto Valente será Cavaleiro da Ordem das Artes e Letras de França. O Origem das Espécies está orgulhoso.
«Já quando os homens chegaram pela primeira vez à Ilha, a encontraram rasa de pedra, que fora fogo vomitado pelos vulcões: pedras colossais, amontoadas a esmo, à semelhança das que se vêem soltas por cima dos calhaus e dos penhascos da costa.»
Governo quer 100% de aprovações no 9.º ano: «Não é uma utopia. Se outros países com os quais nos comparamos o fazem, Portugal também o pode fazer.»
Errei profundamente, totalmente. Pus-me a justificar e a analisar entrevistas do projectista, quando devia era ter dito o essencial: jogámos [reparem como o hooligan se coloca dentro do campo] mal. Estar a falar de um penálti não assinalado e de uma bola ao poste (mal chutada, portanto) é de uma mariquice inenarrável. Não foi de propósito, mas quase, para justificar as assobiadelas no jogo contra o Fenerbahçe. O projectista ainda não compreendeu um dado essencial — as bancadas das Antas aplaudiram, de pé, a derrota do FC Porto com o Panathinaikos em Março de 2003 (golo de Olisadebe), tal como assobiaram a vitória do FC Porto com o Fenerbahçe. Podem não conhecer a matemática oculta do génio, mas sabem reconhecer um bom jogo e bom futebol. E é isso.
[E olhem para cima; lá está aquela elegância fatal: Cubillas, Rolando e Pavão.]
O presidente da entidade que vigia a comunicação social, a ERC, acha que o programa da SIC ‘O Momento da Verdade’ é “uma forma de prostituição”. A acusação é grave e merece ser lida com atenção, vinda de quem vem. Os dicionários são claros sobre o que significa “prostituição” e a palavra deve ser utilizada com cuidado. Passei os olhos sobre o programa e parece-me – estando o mundo como está – que há evidente exagero na designação, mas não o verei mais. Um dos problemas é que o Sr. Nogueira, o mais criticado dos concorrentes, não tem a aura de prostituto de luxo, que se desculpa em situações semelhantes, quando os personagens se vendem por muito mais, mas com aplauso chique; o outro problema chama-se “comando da televisão”. Tem uma série de botões e serve para mudar de canal.
Da coluna do Correio da Manhã.]
Adormeci no sofá, diante da televisão. Não sei se foi na primeira ou na segunda parte, porque ambas foram más, mas lembro-me de ver uns rapazes a jogar futebol nas traseiras de uns prédios em Francos. Depois, ao contrário do que disse Jesualdo, a segunda parte não foi de sentido único. A segunda parte não existiu: aquela equipa está mal formada, mal educada e mal instruída, sem laterais nem discernimento para jogar diante da baliza; vendo aqueles repolhos com pernas a arrastar-se pelo campo, percebia-se que nenhum deles sabia que era preciso jogar futebol para ganhar. Mais do que uma equipa banal, foi uma equipa condenada. Depois de este cavalheiro me ter chamado a atenção há tempos, fui reler a entrevista de Jesualdo Ferreira ao Público e percebi o essencial: «Quero dizer às pessoas que quem define os sistemas de jogo do FC Porto é o seu treinador.» Temo que seja esse o problema; ele bem diz que «é muito fácil para quem está de fora e percebe pouco destas coisas analisar a situação sem levar tudo isto em conta» (tudo excertos da entrevista), mas o que se vê é a banalização de uma equipa onde há quatro ou cinco belas peças e um conjunto de trambolhos que deve ter desaprendido a jogar futebol na pré-época. Ao ler que «com menos espaço é mais difícil criar oportunidades» (uma grande tirada) devia ficar descansado, mas não fico. Sinto-me apenas assustado com a tirada. Reparem nisto: «O FC Porto tem o seu sistema-base. E depois tem princípios, tem métodos e tem estratégias que variam necessariamente tendo em vista alcançar determinados rendimentos e resultados. O sistema-base não define o modelo. O modelo é um conjunto de sistema, princípios, métodos e estratégias. O que se pretende atingir cada vez com maior eficácia é que é o modelo. Portanto, o sistema do FC Porto é o 4x3x3, a sua dinâmica nunca indicia o 4x3x3 permanente, os princípios que o FC Porto tem sob o ponto de vista do seu método, quer seja a zona ou o aproveitamento dos espaços, faz-se através de transições rápidas, a definição das áreas de pressão, a capacidade de ritmar o jogo, que já foi mais forte na época passada do que na anterior. Tudo isto faz parte dos processos que o FC Porto utiliza para chegar ao modelo. O problema é que muitas pessoas confundem o modelo com tácticas e com o sistema. E não é tudo a mesma coisa.» Se o treinador da vossa equipa diz uma coisa destas, o que ficariam a pensar? Que a equipa está sem modelo, seja lá o que isso for, e que não tem sistema, se é isso que eu estou a pensar. Eu devia ter percebido logo: quem diz coisas destas é capaz de tudo, e uma delas é perder com o Rio Ave. Mas, vá lá, não conseguiu.
Não se trata de ter ou não ter simpatia por Santana Lopes. Trata-se, apenas, de verificar, ponto por ponto, os pormenores do caso — relatados por Tomás Vasques. E, portanto, eis como a as informações da «justiça», seja lá o que isso for, servem para tramar mais assassinatos políticos.
O post de Cristina Ferreira de Almeida, no Corta-Fitas.
Com a expulsão dos activistas da Human Rights Watch em Caracas, ordenada directamente por Hugo Chávez, e da forma insultuosa como foi anunciada, espero a esclarecida opinião do dr. Soares sobre o assunto. Não tem que ter opinião, evidentemente; mas ajudava-nos a sermos mais compreensivos.
Vinte e oito anos depois da primeira surpresa, releio O Delfim e tenho pena que «a literatura» não tenha aprendido essa lição de ironia, observação, sentido da proporção.
Que haja políticos que viveram da «política da emigração», não me espanta. Espanta-me que agora falem em chapeladas, depois de terem passado vinte ou trinta anos a organizar chapeladas, a participar em jantares e «festas da emigração», a angariar fundos entre emigrantes – para o partido, para as campanhas –, a promover nomenklaturas locais e estudar colocações políticas escandalosas. Basta viajar um pouco pelas comunidades de emigrantes para ficar surpreendido com o que está em jogo: pequenos interesses, falta de ligação às próprias comunidades, desprezo pela condição de emigrante, desprezo pela ideia de participação democrática. Sim, parece que a opinião da emigração é um pouco «reaccionária». É gente que teve de sair de Portugal para poder viver com dignidade – dizem-lhe agora que, afinal, não tem dignidade bastante para votar e meter o seu voto num envelope. É uma democracia controlada, manejada consoante a feição dos interesses? É, provavelmente, sim. Mas é sobretudo uma vergonha. Uma vergonha que dá vergonha.
Eu, se fosse emigrante – e da próxima vez que fossem visitar-me em romagem, à cata de votos e fundos para as campanhas, a falar de diáspora e das «remessas» – mandava-os à merda.
[Na imagem, Caracas.]
Um deputado social-democrata moderninho diz que a nova lei do divórcio é «uma inovação» no País face à legislação europeia. Pode ser. Mas o espírito das leis é uma coisa – e a aplicação é outra. O legislador (o Parlamento, enfim) devia pensar no assunto em vez de aprovar leis feitas para um mundo ideal onde habitam pessoais ideais e em condições ideais. Nunca é assim. As pessoas concretas, os seus problemas e a maldade habitual acabam por lutar contra as leis para serem mais felizes ou aproveitar-se delas para passarem adiante. Pode ser que eu esteja a ser conservador mas não tenho medo da palavra; simplesmente, basta imaginar divórcios litigiosos concretos (agora exterminados por diploma) para perceber que quem vai sofrer são os mais fracos. Neste caso, as mais fracas.
Da coluna do Correio da Manhã.]
O Expresso desta semana tratará o caso demográfico português: «Pela primeira vez em 90 anos houve crescimento negativo na população portuguesa: em 2007 morreram mais pessoas do que nasceram no nosso país.» Nada disso é estranho, mas a mim surpreendem-me sempre as «políticas públicas» que punem os que se abstêm de reproduzir-se abundantemente em favor das contas da Previdência. Houve uma tentativa, felizmente arrumada na categoria das iniciativas inúteis e pró-chinesas, mas prometem-se mais. Os portugueses não querem reproduzir-se; estão para gozar a vida.
A banda ainda não está afinada, mas tem grandes momentos. O golo de Lucho, precedido de passe atrasado de Rodríguez, é um deles. Outro, entre vários, é o resultado final.
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