O passado é uma armadilha e invocá-lo como garantia de pureza democrática é uma porta aberta para a desgraça. Parece que uns arruaceiros chamaram “fascista” ao ministro Santos Silva. Coisa imbecil. Mas o ex-sociólogo Santos Silva, o mesmo que anunciava um golpe de estado caso Cavaco ganhasse as eleições, tentou ali separar as águas, falando dos heróis da liberdade em 1975, como Soares, Alegre ou Zenha. Nesses anos, Santos Silva queria com toda a certeza uma ditadura do proletariado e, quanto a esses homens, deve tê-los insultado, como era da regra. Maria de Lurdes Rodrigues, a actual ministra da Educação, era, nos finais da década de oitenta, redactora da revista
A Ideia, de “cultura e pensamento anarquista”, e na época devia pensar exactamente o contrário daquilo que hoje propõe. Os arquivos estão cheios desses textos. Não vem daí grande mal; as pessoas evoluem, às vezes melhoram, ou basta que mudem. Mas é pena que conservem, lá no fundo, os tiques da época.
[Da coluna do Correio da Manhã.]