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Se porventura fosse necessário lembrar (e talvez o seja às gerações mais novas) que José Cardoso Pires foi um dos maiores prosadores portugueses do século XX, a publicação de Lavagante (pelas Edições Nelson de Matos) seria um excelente pretexto.
Desde as primeiras linhas desta novela curta, escrita provavelmente entre 1963 e 1968, sente-se o estilo inigualável de Cardoso Pires, o desenho rigoroso das personagens (aqui, uma fabulosa Cecília), o levantamento de ambientes e situações que de modo tão intenso marcaram toda a ficção do autor.
Lavagante (retrato dos tempos do Estado novo) fica, para já, como o primeiro grande acontecimento editorial de 2008.
As novelas da Justiça portuguesa deviam indignar-nos. A palavra está gasta e não significa nada – mas poderíamos ser mais claros: devíamos zangar-nos. Já estávamos preocupados, mas agora devíamos zangar-nos mesmo. Ontem, no CM, João Vaz chamava a atenção para o descrédito que banaliza qualquer decisão dos tribunais sobre questões políticas e partidárias. Tem toda a razão. A mesma coisa acontece nos processos relativos ao Apito Dourado, sob os quais pende a desconfiança de estarem sustentados em profissões de fé, ou pura ignorância, dos investigadores ou dos magistrados. A guerra entre a Procuradoria e o governo é outro dos enredos que pode vir a terminar mal. Para já, desconfiamos das investigações, desconfiamos dos juízes e desconfiamos dos processos. Acabaremos, mais tarde ou mais cedo, a desconfiar da lei – o que seria uma tragédia, num país que tanto gosta de legislar sobre tudo e que se transformou numa cacofonia onde toda a gente fala ‘jurisdiquês’.
[Na coluna do Correio da Manhã.]
Um Pavilhão Atlântico (quase) cheio assistiu ontem a um concerto memorável de um Charles Aznavour em grande forma. É evidente que, aos 83 anos, Aznavour se defende e já não é exactamente o mesmo. Mas é precisamente esse facto que acrescenta uma mais-valia ao evento. Quem quiser ouvir a "voz" tem os discos à venda no mercado. Aqui, ao vivo, não foi a voz que se procurou - foi antes uma certa maneira de encarar a "chanson", um estilo de estar em palco, uma forma de veicular palavras sempre carregadas de muito mundo.
Nostalgia? Claro, nostalgia. Mas é também com ela que se constrói o futuro.
Não se trata de profissão de fé, mas dados os testemunhos mais ou menos públicos de toda esta gente envolvida, parece evidente que a maior parte das acusações vai cair por terra. O «caso Bexiga» é central e constitui um deslize monumental. A ver vamos. É o que acontece quando a justiça se move por profissões de fé.
A ministra da Educação garante que o decreto sobre o novo regime de autonomia e gestão escolar vai proporcionar “uma maior abertura ao exterior”. Precisamente o que eu temia. Exactamente aquilo que o leitor deve temer. Esta anunciada abertura da escola aos “agentes da comunidade local”, como pais, autarquias e “outros agentes” é muito perigosa. Já acho duvidoso que a gestão das escolas possa albergar pais e autarcas; o seu limite deve ser, apenas, uma espécie de conselho consultivo. Mais nada. A ideia de “abrir a escola à sociedade”, muito certinha, não quer dizer absolutamente nada. Penso, aliás, que a escola já está “aberta” demais à sociedade, que a enche de lugares-comuns, erros ortográficos, sintaxe de 'sms', discursos sem nexo, e vários elementos de distúrbio. A democracia, que transformou as escolas em “estabelecimentos de ensino”, uma espécie de “fábrica de cidadãos” em regime industrial, ainda não se desfez da ideologia que a conduziu ao desastre.
[Na coluna do Correio da Manhã.]
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