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A imprensa de língua espanhola está hoje escandalizada com a notícia de que seis professoras da cidade argentina de Corrientes (de um colégio instalado nos arredores, em Pago del Deseo – um nome fantástico) tiveram relações sexuais com o motorista do autocarro escolar. Segundo o Diario del Chaco, tudo explodiu quando a namorada do motorista descobriu as fotos que ele tirou no telemóvel e que guardava no computador: e lá estavam as seis professoras, cinco delas casadas. O rapaz pedia-lhes para fazer as fotos, bem entendido (e, observando-as, não podia ser de outro modo, sorridentes que estão). O correspondente do El Mundo em Buenos Aires diz que «varias de ellas, además de acceder a la solicitud, lo hacían de cara al objetivo y sonrientes», e titula a sua peça como «La 'fiesta sexual' de unas maestras en un autobús escolar escandaliza a Argentina». As fotos e imagens de vídeo foram publicadas no blog El Forro, que ao fim da tarde passou a «service temporarily unavailable». O editorialista diz que «tremendo escandalo hay en Corrientes por la joda de 6 maestras con el chofer de una combi; las fotos las mando a todo el mundo la nobia del chofer cuando las encontro en su computadora.»
Ora, contrariando os pareceres da moral impressa e até do sindicato que vai defendê-las, eu acho que estas senhoras são heroínas. Conheço o Chaco, e conheço Corrientes, no norte da Argentina, a meio caminho do Paraguai e da Bolívia. É uma terra poeirenta e cheia de pântanos (de onde, que eu saiba, só o bom e divertido Mempo Giardinelli pôde arrancar um excelente livro, Luna Caliente, aliás publicado em Portugal pela Temas e Debates), cruzada por contrabandistas que atravessam o rio Paraná. Quem conhece apenas a cidade de Resistencia (coração do Chaco que assistiu às guerras de generais enlouquecidos, e que permanece abandonada a caminho do Norte, dos alcantilados que levam à Bolívia) e a estrada que vai para Corrientes, capital provincial, sabe que não há futuro. Lamento, mas é assim. De um lado e do outro da estrada, pântanos e esconderijos. Passei lá uns tenebrosos dias do Inverno local, a ler o Diario del Chaco e a edição do dia anterior do Clarín. Fui salvo (a Iberia tinha enviado as minhas malas para Guayaquil, no Equador, e para Montevideo) pela descoberta de uma caixa de Hennessy na garrafeira de um bar diante do hotel, que vendia uns charutos panamianos perfumados de cianeto. Agora, imagino o Verão, cheio de árvores ressequidas ao longo das ruas e de ruídos das motorizadas, as estradas poeirentas de todo o Chaco onde cavalgavam antigamente generais vaidosos e bandidos loucos, a proximidade das fronteiras da Bolívia e do Paraguai – e do Brasil, ao longe, atravessando rios e estradas esburacadas –, rodeados de mosquitos e de iguanas. Acho que elas mostraram que a solidão do Chaco (como ela vem nos livros de Mempo) é uma coisa desumana. Estão a ser perseguidas pela Argentina inteira. Mas são heroínas.
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