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«Uma coisa talvez esteja acontecendo: a literatura de ficção não acabou, o que está acabando é o leitor. Poderá vir a ocorrer este paradoxo, o leitor acaba mas não o escritor? Ou seja, a literatura de ficção e a poesia continuam existindo, mesmo que os escritores escrevam apenas para meia dúzia de gatos pingados?[FJV]
Kafka escrevia para um único leitor: ele mesmo. Recordo Camões. Ele era um arruaceiro, e acabou na prisão, ou por motivos de suas rixas ou por ter se envolvido com a infanta Dona Maria, irmã do rei João III. Para obter o perdão do rei ele propôs-se a servi-lo na Índia, como soldado. Lá ficou 16 anos e, afinal, a bordo de um navio voltou para Portugal, acompanhado de uma jovem indiana, que ele amava, e a quem dedicou o lindo soneto "Alma minha gentil, que te partiste". O navio naufragou e Camões só pensou, durante o naufrágio, em uma coisa: salvar o manuscrito dos Lusíadas e dos seus poemas. Deixou a mulher amada morrer afogada (confesso que especulo), e perdeu todos os seus bens, mas salvou os seus manuscritos. Para quem ler? Estávamos no século XVI e muita pouca gente em Portugal sabia ler. Mas Camões pensou nesse punhado de leitores, era para eles que Camões escrevia, não importava quantos fossem eles.»
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