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por FJV, em 09.02.06
||| O absurdo.
Vitalino Canas entrou no reino do absurdo.

Adenda: comentário de Paulo Gorjão («São todos a mesma merda»).

Ainda sobre as declarações do ministro Freitas do Amaral, e para desmentir a ideia de que a sua opinião é idêntica à dos outros ministros da União, ver aqui a posição francesa.

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por FJV, em 09.02.06
||| Respeito & bom-senso.
Ouvi há pouco o Ministro Freitas do Amaral na SIC Notícias a tentar explicar melhor a sua reacção à questão dos cartoons. Continuei a não compreender. Como escrevi ontem e hoje repito, não está em causa a necessidade de o governo, através de um porta-voz, tentar apaziguar o ambiente de guerrilha. Continua a ser lamentável que o governo, mesmo que através de um porta-voz, não tenha manifestado a sua solidariedade à Dinamarca e a sua aversão às ameaças de morte, e outras formas de violência que foram agitadas nos últimos dias. Ao contrário do que pensa o comum dos disciplinadores da liberdade, os ocidentais não necessitam dos seus preciosos avisos para saber distinguir o Islão dos fundamentalistas islâmicos e da artilharia que lhes corresponde. Basta ver a reacção aos atentados de NY, de Madrid e de Londres para perceber que está clara essa separação e essa distinção. Tirando meia-dúzia identificada de trogloditas, ninguém de bom-senso fez essa associação. Leiam a imprensa da época.
Nunca precisei de mestres assim para compreender o Islão, para elogiar a sua importância e para ler os seus textos. Ninguém precisa de mestres assim para entender que há uma diferença; especialmente depois de, desde há quatro anos, se ter multiplicado a atenção ao Islão, à sua história e à sua importância.
O que incomoda, verdadeiramente, é a tentação da liçãozinha de moral, o apelo patético a que «ajoelhem, ajoelhem» ou a sugestão, como diz uma leitora nos comentários a este post, de estarmos todos caladinhos (que isso é o melhor, caladinhos -- respeitinho é que é preciso). Já escrevi, antes, que não interessa agora discutir questões de deontologia geral sobre a publicação ou não dos cartoons («eu não os publicaria por princípio, mas, se está em causa a liberdade de expressão, eu publicá-los-ia, sim, para que não julguem que podem demolir a minha liberdade como demoliram os Budas de Bamiyan»). O que está em causa é o ar patético do comunicado do MNE, que não se referiu à Dinamarca (preferindo deter-se a classificar de «lamentável» o que se passou «em alguns países europeus»), e o ar de patetas de algumas boas consciências que agora descobriram a «seriedade do jornalismo» e a necessidade de «bom-senso» e de «bom-gosto» quando se referem outras culturas e outras religiões. O discurso sobre religião está inquinado -- quer pelo espírito de cruzada, quer pelo proselitismo, quer pela confusão permanente entre o ruído de Deus e o barulho das suas multidões. Não entrarei nele. Mas o discurso sobre a liberdade ameaça estar também inquinado com essa patetice de dizer que «a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros»; claro que acaba nesse ponto; claro que a minha liberdade não pode pôr em causa a liberdade dos outros; claro que isso é uma banalidade. Claro que ninguém esteve na manifestação a defender que a nossa liberdade é mais importante do que a liberdade dos outros, ou que a nossa civilização é mais importante do que a dos outros.
Mas é confrangedor o medo que marca o debate, o medo que se confunde com respeito, o medo que entrou nas nossas discussões e na nossa pobre agenda política. Esta ideia de pedir desculpa é profundamente errada; hoje pede-se desculpa por causa de uns cartoons inocentes e naïves, amanhã pede-se desculpa por sermos contra a excisão feminina em países onde ela se pratica (porque estamos a ferir susceptibilidades culturais), por sermos pelo fim da discriminação das mulheres, por sermos pelo fim da discriminação de homossexuais e de asiáticos ou de pretos ou de brancos ou de leitores de Mark Twain ou de utilizadores de Macintosh.
Por isso continuo a não perceber o comunicado do MNE nem a reacção dos que acham que devíamos estar caladinhos e quietos enquanto em Londres pedem outro atentado e em Damasco pedem a morte dos infiéis. Porque o petróleo comanda as nossas vidas? Porque nos podem pôr uma bomba no aeroporto?
O senhor Ministro dos Estrangeiros diz que o Conselho da Europa e a União vão promover jornadas para «nos percebermos melhor», nós e os «do lado de lá». A formulação é errada, mas serve para o essencial. Eu acho que sim, que precisamos de ser entendidos; eu acho que o ministro Freitas do Amaral precisa de saber que «nós», nós, os que gostamos da liberdade, não erguemos nem o crucifixo nem a espada, nem o alfange, nem a palavra, para pedir o silêncio dos outros ou o seu sacrifício. Não queremos uma lei de esferovite para punir a falta de respeitinho. Não queremos ajoelhar para pedir desculpa pelo nosso riso, ou pelo nosso laicismo na política -- porque isso é uma conquista feita por gerações de homens dignos e ilustres e cultos e decentes.
Nós, os que não precisámos do 11 de Setembro para ler os autores do Islão e para sentir o fascínio pelo Islão (porque até isso nos querem tirar com as leis com que, de Bruxelas, nos ameaçam agora, para punir a blasfémia e o silêncio sobre as religiões), e para ler Al’Mutamid, nós conhecemos o respeito pelas outras religiões e até pela nossa, quando vem ao caso termos uma ou sentirmo-nos ligados a uma. Nós, os que nunca fomos os snobs do Ocidente e nos limitámos a ser ocidentais, não precisamos que nos ensinem a distinguir entre o «fundamentalismo islâmico» e o Islão e até os seus mestres. Mas nunca nos negámos a discutir, a pensar e, até, a guardar silêncio. E guardaremos silêncio, se for preciso. Mas nunca esperámos que um de nós agitasse o dedinho a ofender-nos e a chamar-nos irresponsáveis quando está em causa aquilo que nos permitiu, na verdade, que pudéssemos interessar-nos pelo Islão, pela cultura árabe, pelo Oriente, pelo deserto, pelas cidades de areia. Ou seja, a liberdade. Foi a liberdade que nos permitiu ler os primeiros textos de poesia árabe, interpretar as Cruzadas, discutir a «superioridade moral» da cultura ocidental e, até, no meu caso, ter entrado pela primeira vez numa mesquita. Nós fazemos um favor a Bin Laden, como disse Freitas do Amaral hoje? O remédio é não falar? O remédio, do ponto do vista de tantas pessoas que agora se descobriram sérias & respeitadoras & deontologicamente puras, é confundir tudo («deriva xenófoba», «ofensa religiosa», «licenciosidade», «estratégia para não melindrar os moderados», «respeito pela subjectividade», etc, etc) para que nada tenha sentido e para que os burocratas de Bruxelas (esses grandes especialistas em diálogo civilizacional que impõem subsídios europeus) elaborem uma lei anti-blasfémia? Belo serviço.
Porque essa meia-civilização, rendida às ameaças, ajoelhada diante de pressões, não nos serve para nada, de facto. É boa para censores e para mestres de deontologia pura, para autocratas de bairro e para administradores de consciência. Mas não é boa para quem sabe que não se pode voltar atrás.
Ajoelhem, ajoelhem. Comecem a ajoelhar por tudo e por nada.

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por FJV, em 09.02.06
||| Esta semana.
No Livro Aberto, João Pedro George. No sábado e depois com repetições.

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por FJV, em 09.02.06
||| Ofensas.
Artigo de hoje no JN.

No DN, ler o artigo de Luciano Amaral. No Público, o texto de José Pacheco Pereira.

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