||| Uma nota pequena, 2.O
Eduardo Pitta pergunta: «Afinal, acreditamos ou não acreditamos no direito à liberdade de expressão?»
Era essa a pergunta que eu tinha feito. Vamos lá: o que é que está em causa? Uma série de cartoons. Os cartoons têm qualidade? Não me interessa saber. Os jornais ingleses e americanos publicaram os cartoons? Tanto me faz; eu não os publicaria por princípio, mas, se está em causa a liberdade de expressão, eu publicá-los-ia, sim, para que não julguem que podem demolir a minha liberdade (e a dos outros) como demoliram os Budas de Bamiyan. Os cartoons são ofensivos? Não me parece, acho-os um tanto
naïves; mas se alguém acha que são ofensivos, que o diga. Isto trará prejuízos à economia dinamarquesa e, por arrastamento, europeia? Sim; é talvez a altura de a
economia política europeia declarar, com simplicidade, que está dependente do petróleo,
como a administração americana já o fez (com o Vaticano atrás, que aproveita a boleia do Islão para se queixar de alguns atrevimentos de que tem sido alvo) , aliás, tendo vindo a condenar os cartoons, de rabinho entre as pernas e dedo moralizador espetado. Mas, afinal, entre nós, que somos irresponsáveis (é assim que José Sócrates e os bispos
nos vêem), «acreditamos ou não acreditamos no direito à liberdade de expressão?» Era essa
a pergunta que eu fiz; é essa a pergunta que tu fazes. É essa a pergunta que o
Osvaldo Silvestre faz; é essa a pergunta que o
Gustavo Rubim deixa no seu texto. É isto
insensato, como sugere e afirma (são tempos diferentes) o Osvaldo Silvestre? É. Devemos deixar de o dizer? Não.
O
Osvaldo Silvestre chama a atenção para um texto de M. Yiossuf Adamgy, publicado no
Público («A liberdade de expressão deve ter limites»). O director da
Al-Furqan, defendeu, há dois anos, na Antena Um, a aplicação da lei islâmica e a lapidação de Amina. É ele que aparece neste momento a dizer que «a liberdade de expressão deve ter limites». Tudo muito parecido com
este cartoon. Não há maior
insensatez (uso a palavra no seu sentido
estratégico) do que ceder neste capítulo: no da dignidade.
Outra coisa: é evidente que não há muita gente «entre nós» (os irresponsáveis) a querer fazer cartoons com a vida sexual da rainha da Dinamarca. Chama-se bom-senso. Mas se queres coleccionar a quantidade de cartoons publicados na imprensa árabe e ocidental que facilmente poderia ser considerada «ofensiva», eu peço meças.