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por FJV, em 04.11.05
||| Humanidades e messianismo.
Sim, também vi a entrevista de Soares à TVI. Conforme o esperado mas com Soares em forma, disposto a atacar: Cavaco é o bárbaro que vem das Finanças, ele é o homem de letras que publicou vários livros e discreteou sobre a globalização. Este vai ser um dos tons da campanha, salvo erro, como um dos pecados do soarismo mais convencido de si mesmo: Soares como homem de letras. A imagem é potente e satisfeitinha. Para que queremos um presidente? Para que, de sobrolho vigilante, debite uns nomes indiscutíveis e tenha referências, seja um homem das humanidades. Evidentemente que as humanidades não fazem um humanista, mas a mensagem vai ficando. Salvo erro, e percorrendo os nove livros de Mário Soares (se os livros de entrevistas entram na contabilidade), e com todo o respeito pela figura*, não há ali uma ideia, uma proposta, uma chama de criatividade: há memória, uma narrativa do seu tempo, um testemunho que defende o seu lugar. O que Soares defendeu foi o seu currículo político contra o bárbaro. A acusação de que Cavaco tem «uma concepção de democracia muito pouco estruturada» é uma dramatização em dois tempos falsos e não merecíamos que Mário Soares sucumbisse a essa tentação pobrezinha; nem à que o deixou, suspenso no ar, invocando «pressões», a dizer que o governo de Sócrates cairá se Cavaco for eleito.
Basicamente, em termos políticos, o que Soares disse nas entrevistas é literatura justificativa e exercício narrativo; o que disse sobre o futuro pode resumir-se a coisas normais; sobre literatura, não acrescenta nada (pelo contrário); sobre o tempo actual, trata-se de um discurso com convencimento e algum ressentimento.
Soares tenta arrepender-se do que disse de Sócrates -- mas já vai tarde. Teria de se arrepender também do que disse de Blair, de Guterres e de quem não gosta ou veio depois de si (o que, em alguns casos, é a mesma coisa). Tenta também recuperar a imagem do «papão terrível» que vem substituir, nesta campanha, o perigo do fascismo ou do golpe militar (que anunciou recentemente), o que é muito fraco. Mas o que ele tenta é, sobretudo, enviar este recado: ele não tem currículo para isto; eu sou o currículo. O messias, basicamente.

* Como entraremos em campanha eleitoral daqui a nada, não vale a pena repetir a expressão «e com todo o respeito pela figura». Disse-o sempre e está escrito nos textos anteriores sobre o ex-presidente.

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por FJV, em 04.11.05
||| Comentários.
Boas notícias de França. Portugal agradece.

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por FJV, em 04.11.05
||| Cesariny. Finalmente.










Finalmente, alguém teve coragem. O Prémio Vida Literária, da Associação Portuguesa de Escritores foi atribuído a Mário Cesariny. Eu explico porquê «a coragem». Porque lá, onde se atribuem os prémios, há sempre gente que admira Cesariny, e gente que conhece o seu nome e que toma de empréstimo dois versos sobre a miséria contentinha; mas que, na verdade, quando chega a altura de atribuir prémios, medalhas, distinções, tem as suas necessidades e as suas conveniências. Cesariny é amado; claro que sim. Mas tão inconveniente. Tão inconveniente em várias matérias: na memória do século, nas guerrinhas do surrealismo, na matéria sexual & bom comportamento, naquilo que diz quando se está nas tintas. Por isso, finalmente alguém teve coragem e esqueceu que muita gente tem tanta inveja de Cesariny.

Ver, também, o post de Eduardo Pitta no Da Literatura.

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por FJV, em 04.11.05
||| A noite, o que é?, 56.
As pessoas arrumam as suas coisas. Catalogam a sua vida, preparam-se para atravessar o corredor, limpam os móveis, fecham os olhos diante das varandas, olham a poeira que fica sobre a terra, escolhem a sua roupa. Um anel, as fotografias, as pequenas datas, uma gravata comprada noutro país, um baralho de cartas muito usadas, um mapa de estradas do ano de 1973, um recorte de jornal (a chegada do homem à Lua, obras na ponte sobre o Tejo), um corta-papel tingido por uma mancha de ferrugem, uma agenda de telefones em que nenhum deles está correcto. A noite chama pelos inventários.

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por FJV, em 04.11.05
||| Isaiah Berlin.










Atenção a dois lançamentos a não perder: Rousseau e Outros Cinco Inimigos da Liberdade, de Isaiah Berlin, e O Mal no Pensamento Moderno, de Susan Neiman (edição da Gradiva).

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por FJV, em 04.11.05
||| Outro grande livro.













O Profeta do Divino Castigo, de Pedro Almeida Vieira, também me surpreendeu muito. Nove Mil Passos, o romance anterior, sobre o aqueduto das Águas Livres, já anunciava o herdeiro do grande autor de romance histórico, que é Fernando Campos. Mas este confirma. Uma narração diabólica e bem informada.

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por FJV, em 04.11.05
||| Grande livro.













O livro do Rui Tavares (entrevistei-o anteontem no Escrita em Dia) é um grande livro sobre o século XVIII e sobre a forma de pensar as catástrofes e de nos relacionarmos com a sua memória. Muito bem escrito, é uma excelente surpresa.

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por FJV, em 04.11.05
||| Recolonização.
Sem complexos: «Fito o mar, o horizonte. A brisa salgada bagunça meus cabelos. Estendo os braços ao oceano Atlântico. De bikini, na praia, num dia de Sol, espero a chegada do grande rei. Pois sei que cabe a Portugal ressuscitar a alma do mundo.» Santa escreve sobre recolonização; e sobre o sebastianismo -- o verdadeiro.

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por FJV, em 04.11.05
||| Basicamente.
Basicamente, de cada vez que Eduardo Prado Coelho escrever um artigo sobre um grupo de pessoas, e omitir nomes que estão no grupo, para incluir outros que não estão, acharei isso natural.

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por FJV, em 04.11.05
||| Revista de Blogs. Póquer literário.
«-- Aposto um Lúcio Cardoso.
-- O teu Lúcio mais 2 Rubens Fonseca.
-- Passo.»
{Maira Parula, no Prosa Caótica.}

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por FJV, em 04.11.05
||| Prémios franceses.
François Weyergans, Prémio Goncourt (Trois Jours Chez Ma Mère) e Nina Bouraoui (Mes mauvaises pensées)com o Prémio Renaudot. Principal derrotado, Michel Houellebeck, que perdeu o Goncourt por apenas dois votos da academia, com o seu livro La Possibilité d'une île. Informações e links aqui.

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