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Poemas de Roberto Bolaño, 1.

por FJV, em 06.12.13

 

[A MINHA CARREIRA LITERÁRIA]

Recusas de Anagrama, Grijalbo, Planeta, com toda a certeza

         [também de Alfaguara,

Mondadori. Um não de Muchnik, Seix Barral, Destino...

         [Todas as editoras... Todos os leitores...

Todos os gerentes de vendas...

Debaixo da ponte, enquanto chove, uma oportunidade de ouro para

         [ver-me a mim mesmo:

Como uma serpente no Pólo Norte, mas escrevendo.

Escrevendo poesia nos país dos imbecis.

Escrevendo com o meu filho nos joelhos.

Escrevendo até que cai a noite

com um estrondo dos mil demónios.

Os demónios que hão de levar-me ao inferno,

mas escrevendo.

 


 


[ESTA É A PURA VERDADE]

 

Fui criado ao lado de revolucionários puritanos

Fui criticado ajudado empurrado por heróis

da poesia lírica

e do baloiço da morte.

Quero dizer que o meu lirismo é diferente

(já tudo está escrito mas permitam-me

acrescentar qualquer coisa mais).

Nadar nos pântanos da vulgaridade

é para mim como uma Acapulco de mercúrio

uma Acapulco de sangue de peixe

uma Disneilândia submarina

Onde estou em paz comigo.

 

 


 

 

[O ENTARDECER]

 

O pai de Lisa viu passar esse entardecer

até lá em baixo

até México D.F.

O meu pai viu esse entardecer calçando as luvas

antes do seu último combate[1].

O pai de Carolina viu esse entardecer

derrotado e doente depois da guerra. O mesmo

entardecer sem braços

e com os lábios

delgados como um queixume.

O que o pai de Lola viu trabalhando numa

fábrica de Bilbau e o que

o pai de Edna viu procurando as palavras

exactas da sua prece.

Esse entardecer fantástico!

Aquele que o pai de Jennifer contemplou

num barco no Pacífico

durante a Segunda Guerra Mundial

e o que o pai de Margarita contemplou

à saída de uma taberna

sem nome.

Esse entardecer corajoso e trémulo, indivisível

Como uma seta lançada ao coração. 

[Poemas publicados em La Universidad Desconocida. Tradução minha.]

 

[1] Léon Bolaño, pai de Roberto Bolaño, foi boxeur e condutor de camiões. Chegou a ganhar o titulo de campeão de pesos pesados antes de conhecer Victoria Avalos, professora primária, com quem casou e com quem se mudou para Quilpué. Léon e Victoria separaram-se em 1973. Léon e Roberto Bolaño não se viram durante 22 anos – o encontro entre os dois deu-se em Madrid, em 2000, quando o escritor trabalhava em 2666. «Matou-se por causa desse livro. Quase não dormia, era uma obsessão», declarou Léon Bolaño em 2006. O pai soube da morte de Roberto apenas dois dias depois.

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