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Reforma do Estado, 2.

por FJV, em 11.01.13

Áreas como as que João Gonçalves identifica («qualificação das pessoas, das instituições e do território, a cultura, a economia, o ambiente ou o emprego e o pós-emprego») são prioritárias em qualquer plano de reforma do Estado, que deve tratar, em primeiro lugar, de responder a algumas questões essenciais: para que serve o Estado?, o que devem os cidadãos esperar do Estado?, até onde vai a sua autoridade e acção?; onde é ilegítima (e imoral) a sua autoridade?, etc. O debate sobre essas matérias deve fazer-se com abertura e espírito de tolerância, em liberdade, mas sobretudo convocando para ele — além dos partidos políticos — as pessoas mais qualificadas.

Há anos que muita gente tem contribuído para esse debate, à esquerda e à direita. Não faz sentido entregá-lo a comentadores que vivem do curto prazo e têm o seu mercado dependente do grau de inanidades apreciadas pelas audiências (é um mercado) — nem reduzi-lo a especialistas em finanças, a «senadores» cujo único «mérito» é o ressentimento, ou a universitários e «politólogos» que fazem da universidade um megafone para fazerem política sem entrarem na política («ah, nós não sujamos as mãos»). Faz sentido que seja feito com os cidadãos. E, já agora, com mais empresários do que gestores de empresas. Com mais gente que faça pela vida; porque não se trata de um debate sobre como salvar este Estado mas, pelo contrário, sobre como mudá-lo porque a sua existência é insustentável. 

Só há debate quando as pessoas querem debater (o que pode não acontecer). Ora, o que se tem visto é, sobretudo, gente que quer debater desde que o debate não ponha em causa ou a Constituição, ou privilégios, ou reformas, ou regalias, ou direitos, ou princípios, ou preconceitos, ou a perspectiva de uma percentagem eleitoral. Um debate que não ponha em causa não existe. E há muitas coisas a pôr em causa.

Neste cenário, o «relatório do FMI» é um contributo; não é, naturalmente, um contributo generoso — mas não se esperava que fosse. Não vale a pena dar crédito a tanta indignação e pirueta verbal (e há gente com menos «indignações» depois de lê-lo). Ora, um «relatório do FMI» não é o instrumento mais indicado para iniciar o debate sobre a reforma do Estado português; quem quer lançar esse debate tem o dever de iniciá-lo e de desenhar o campo onde ele há-de decorrer. Face a essa ausência, o «relatório do FMI» deixa o governo refém de uma «ocupação estrangeira» e transforma o debate numa contabilidade de maldades a praticar — sem explicações, sem contextualização, sem história, sem sentido. 

Estamos a tempo de fazê-lo, a esse debate? Estamos. Há condições para ele ser feito? Céptico, muito céptico. 

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