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Luís Menezes Leitão escreveu um importante post sobre direitos civis:
«É perfeitamente constitucional confiscar sem indemnização os rendimentos das pessoas. É igualmente constitucional o Estado decretar unilateralmente a extinção das suas obrigações apenas em relação a alguns dos seus credores, escolhendo naturalmente os mais frágeis. E finalmente é constitucional que as necessidades financeiras do Estado sejam cobertas aumentando os encargos apenas sobre uma categoria de cidadãos. Tudo isto é de uma constitucionalidade cristalina.»
Os portugueses habituaram-se a aceitar princípios discutíveis «em nome da Nação»: as leis servem o Estado, a retroactividade das leis é aceitável desde que sirva os interesses do Estado, o Estado pode decretar regimes de excepção a seu favor quando lhe for mais conveniente (inclusive, furtar-se a leis da UE), o cidadão deve fazer prova de tudo o que o Estado entender. A lista é infindável e pode ser acrescentada de tudo o que uns seres estratosféricos, incluídos entre os «constitucionalistas», descortinarem a favor do Estado nas possibilidades do texto da Constituição. A paixão doentia pelo Estado e pela Constituição como seu instrumento privilegiado é um caso patológico da politologia portuguesa, para quem os direitos civis são um óbice, um obstáculo e – crescentemente – uma ninharia que põe em causa os interesses absolutos e intocáveis do Estado. Uma sociedade civil fraca, sem opinião, invejosa, ressentida, pateta, rendida ao argumento de «quem não deve não teme», aceita tudo – o poder discricionário do Estado, a inversão do ónus da prova, a violação da privacidade, sucessivos e injustificados agravamentos fiscais, a má gestão da coisa pública, o assalto aos rendimentos em nome dos interesses de um Estado mal gerido e gastador, investimentos mal estudados e mal realizados, tudo. E vota em conformidade, vota por simpatia, porque é mais facil, porque é mais facilmente convencida e ludibriada – e porque quer ser convencida e ludibriada. Para esta sociedade civil delapidada e privada de si mesma, ressentida e silenciosa, é normal que os constitucionalistas forneçam pareceres à medida do Estado. Nada a prende à Constituição, que é uma espécie de disco voador.
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