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Azar.

por FJV, em 24.07.10

Tomás Vasques põe o dedo na ferida a propósito das discussões sobre a revisão constitucional: o país fervilha de constitucionalistas que defendem a Constituição porque passaram anos a estudá-la («anos de estudo da matéria»). Na verdade, devemos temer muito este reaccionarismo dos que acham que não se pode mexer na Constituição, como não se deve mexer nas cores da bandeira ou nas estrofes do pobre hino. A querela em torno dos poderes presidenciais, então, é a mais ridícula de todas — porque já se sabe que, até agora (a esta proposta), a discussão foi encomendada à medida dos interesses imediatos. Os proprietários da Constituição servem-se de uma aura que detêm com abnegação — a de serem proprietários da Constituição, de se recordarem do hemiciclo, dos bravos combates por um artigo ou da negociação por outro, num heroísmo de fantasmas. Mais uma vez, um pouco de estudo do século XIX (e do período 1820-1850) seria da máxima utilidade. Convenhamos: muita gente acha que não se deve mexer na Constituição apesar de a Constituição não ser adequada, porque — precisamente — se mete onde não é chamada. Compreende-se o princípio, o de não se poder proceder a revisões periódicas da Constituição sob pena de o texto perder o que lhe resta de honra, dignidade e princípio. O problema é que os seus princípios estão errados, a sua dignidade está ferida e a sua honra já ninguém lha reconhece. A Constituição foi o produto de um processo revolucionário e as revisões posteriores não lhe retiraram essa marca. Tomás Vasques acha que há uma discussão política & ideológica que vale a pena travar em torno da Constituição e que não se pode reduzir a questões técnicas. Tem razão. Uma das coisas que há a fazer é tentar que o seu texto seja respeitado por todos os portugueses. Para isso, o melhor caminho não é mudar os as opiniões, as orientações políticas e as opções dos portugueses — mas transformar a Constituição num texto útil, mais neutro, de garantias mínimas ou máximas, essencial. Agora, esta ideia peregrina de que os senhores professores se dedicaram a «anos de estudo da matéria» é verdadeiramente para fazer rir. Azar.

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