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Corrupção, etc.

por FJV, em 11.12.09

A pátria parlamentar descobriu que pode legislar à vontade sobre a corrupção e aproveita a oportunidade. De facto, quando há um problema sério, nada como um bom pacote legislativo. Os legisladores rejubilam, os cidadãos — tranquilizados — aplaudem um magistrado (lembram-se?) que designou tentativa de corrupção a oferta de um Swatch comemorativo.

Não interessa. O que interessa é que, de cada vez que se amontoam processos e investigações esburacadas por fugas ao segredo de justiça e por notícias cirúrgicas e bem colocadas (com origem nos corredores dos tribunais ou das polícias, ou nos escritórios dos advogados), os nossos legisladores acham que podem tratar do problema com mais leis.

O pacote sobre enriquecimento ilícito é muito popular e corre o risco de ser aplaudido, de quatro, pela multidão — uma vez que se inclui a excrescência «ilícito», a que em breve bastará cair o «i» inicial para se entrar na paranóia aguardada. Com o ataque ao enriquecimento ilícito, um justíssimo combate, vêm a inversão ao ónus da prova, a desconfiança permanente transformada em motor da investigação e a quebra dos sigilos profissionais. Nos comentários a este artigo, por exemplo, alguém defende o fim do «segredo profissional dos advogados no que ele não tem de essencial». Em breve, e por extensão (a ironia desculpa-se) outras ordens profissionais terão também os seus sigilos quebrados em nome da luta contra a corrupção ou contra outros males que afectam a república, como o colesterol alto, a obesidade, o adultério ou o uso exagerado de coentros.

Mas é um primeiro passo. Com a inversão do ónus da prova, essa grande conquista da democracia (é o povo que a pede, suponho), entraremos num admirável mundo cheio de pessoas honestas ou tendencialmente purificadas, em que não haverá mais financiamento obscuro das campanhas partidárias (prometem?), não haverá mais nomeações sem escrutínio e sabatina (prometem?), não haverá mais empresas favorecidas — politicamente — em concursos (prometem?), não haverá mais «vírgulas» nem contaminações de investigações por suspeitas políticas. Seremos exemplares.

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